sexta-feira, 30 de abril de 2010

Biodigestores: produtores confirmam benefícios no Piauí



Realizado dia 24 de abril na propriedade do agricultor Alberto Mendes de Carvalho, um dos três beneficiados com os biodigestores na cidade piauiense de Batalha, o "Dia de Campo" do Projeto Energia do Produtor, uma parceria da CARE Brasil, Sebrae e UPS, reuniu um número expressivo de agricultores, produtores de caprinos e ovinos, técnicos e representantes de várias instituições que atuam com ações para o homem do campo, como o Banco do Nordeste do Brasil e a Embrapa Meio-Norte.

O encontro, que contou com o apoio da Prefeitura de Batalha e do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Batalha, serviu para a equipe técnica da CARE Brasil demonstrar a viabilidade econômica e socioambiental dos biodigestores, que transformam esterco de animais em biogás e biofertilizante.

Além da palestra sobre a utilização de biogás, biofertilizante e manejo de biodigestores em propriedades familiares, o veterinário e funcionário do Programa Piauí da CARE Brasil, Anísio Neto (foto à direita), fez uma demonstração do funcionamento do biodigestor instalado na comunidade Carpina 2.

Muito empolgado por receber vizinhos, amigos e muitos curiosos em sua propriedade, o agricultor Alberto Mendes de Carvalho (foto abaixo) não conseguia esconder a satisfação de ver as pessoas perguntando sobre os benefícios gerados pelo biodigestor. "A refeição que será servida para os participantes do Dia de Campo foi feita hoje no fogão movido a gás do nosso biodigestor. Eu chamei as pessoas para verem as panelas fazendo a comida no fogão porque elas sempre me perguntavam se o gás usado na cozinha era realmente do tanque do biodigestor", disse, revelando ainda que usará o biogás para fazer funcionar um motor que gera energia elétrica, além do uso dos biofertilizantes nas lavouras de melancia e banana que pretende fazer futuramente.

Francisco das Chagas Oliveira, da comunidade Baixa do Cedro, também foi um dos contemplados com um biodigestor em Batalha. "Já estou economizando R$ 40 por mês desde que comecei a usar o gás do biodigestor. Em um ano, só com o biogás usado no fogão, eu vou conseguir economizar quase 500 reais, um valor que vou aplicar na melhoria da minha propriedade. Para mim, foi um desafio porque era o início de um projeto desconhecido na nossa região, mas mesmo assim eu apostei e hoje não me arrependo nem um pouco de ter feito isso", citou o agricultor, que passa uma hora por dia no trabalho de colocação de esterco de caprinos no biodigestor e usa os biofertilizantes no adubamento de sua horta.

Projeto Energia do Produtor


O projeto, que teve suas atividades iniciadas em 2009 no Norte do Piauí, implantou cinco biodigestores em três cidades: Batalha, Pedro II e São João do Arraial. Edivaldo Pereira Chaves, presidente do assentamento Paraíso, em Pedro II, comentou sobre a utilização do biodigestor no primeiro assentamento piauiense formado por jovens técnicos agrícolas. "O biodigestor abastece duas famílias com o biogás, que é usado nos fogões. Nosso objetivo é gerar biogás para as 13 casas do assentamento, além de energia para uma forrageira que produz alimentos para os nossos rebanhos de caprinos, aves e suínos, reduzindo os custos da nossa minifábrica de ração", comentou.

Prestigiando o evento que contou com a presença de caravanas de várias comunidades do município, de jovens estudantes da Escola Família Agrícola Cocais, em São João do Arraial, e de produtores de leite e pesquisadores da cidade de Parnaíba, o prefeito de Batalha, Amaro Melo (na foto, em pé, o primeiro da dir. p/ esq.), manifestou seu apoio à iniciativa de geração de energia renovável do projeto.

"Um dos maiores desafios em todo o mundo atualmente é a busca urgente de fontes de energia alternativa e renovável. Esse projeto veio ajudar o homem do campo a ficar com uma menor dependência energética dos modelos tradicionais. Os três biodigestores instalados em nossa cidade já estão mostrando resultados concretos e positivos. Eles geram economia e renda para os agricultores familiares, contribuem para a imunização dos rebanhos de caprinos e ovinos contra as verminoses e preservam a biodiversidade regional", afirmou o gestor público.

Acompanhando a implantação dos biodigestores desde as primeiras palestras de apresentação do projeto para os agricultores, Anísio Neto comemorou com os agricultores os bons resultados do projeto. "Com as ações do Energia do Produtor, resgatamos a tecnologia dos biodigestores para o agricultor familiar com o objetivo de empoderá-los na sua autonomia de energia para o cozimento de seus alimentos e para o uso dos biofertilizantes na lavoura. Nós estaremos utilizando, posteriormente, o biogás em motores para o funcionamento de irrigação, avicultura e outras atividades, e para a geração de energia elétrica nas propriedades. O homem do campo está sendo empoderado de um recurso natural que ele já dispõe, que é o esterco dos animais, com o intuito de tornar o agricultor independente e sua unidade produtiva sustentável, economicamente viável e ambientalmente correta", afirma Anísio.

O projeto Energia do Produtor é realizado em parceria com o Sebrae e com recursos da UPS. O modelo de biodigestor implantado em Batalha produz seis metros cúbicos de biogás diariamente, o suficiente para fazer funcionar um fogão, uma geladeira e ainda ligar um gerador de energia por algumas horas.

Se você tem interesse em saber mais sobre esse projeto, escreva para comunicacao@br.care.org.

Matéria publicada em 27/04/10. FOTOS tiradas no Piauí - divulgação CARE Brasil.

domingo, 25 de abril de 2010

Catadores serão beneficiados com o pagamento por serviços ambientais urbanos

24/09/2009 O Ministério do Meio Ambiente vai estimular o trabalho do catador de materiais recicláveis com o Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos (PSAU) e garantia de preço mínimo para os produtos.

A iniciativa, inédita no mundo, foi anunciada nesta terça-feira (22/9), pelo ministro Carlos Minc, durante o 8º Festival Lixo e Cidadania, em Belo Horizonte (MG). O Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis estima que cerca de 1 milhão de catadores em todo o Brasil poderão ser beneficiados pela medida.
O projeto visa o pagamento para os catadores pelo serviço prestado ao reciclar lixo, assim como acontece com o pagamento por serviços ambientais realizado na floresta com o plantio de árvores.
Dentre os ganhos ambientais gerados pela coleta correta do lixo está a redução da quantidade de resíduos no ambiente, impedindo a poluição da água e do solo. Esse material é direcionado para locais em que podem ser reciclados e voltar a ser utilizados.
No painel "As transformações ambientais e os desafios para a gestão dos resíduos sólidos urbanos - visão governamental", Minc disse que o "lixo é matéria-prima fora do lugar".
Outro benefício de reinserir esse produto no mercado é a economia da energia que seria usada para a produção de novos materiais. Isso está diretamente relacionado a outro ganho ambiental, que é a redução de emissão de gases de efeito estufa. "Reciclando a gente economiza a energia para produzir o alumínio e o plástico, e como isso a gente deixa de emitir CO², que aumenta a temperatura global, derrete as geleiras e aumenta o nível do mar", explicou Minc.
E para garantir um preço justo pelo serviço prestado pelo catador, o MMA fez uma parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), que irá estudar quanto deverá ser pago por quantidade de material reciclado. Para Minc, o PSAU vai ser um estímulo para que o catador continue fazendo sua coleta de resíduos mesmo em casos de crise econômica, quando o preço do material oscila.
O catador ainda terá o benefício do preço mínimo para o produto reciclado - a exemplo do que acontece com os produtos da sociobiodiversidade, como a Castanha-do-Brasil, garantindo renda.
Minc também disse a uma plateia, com cerca de 700 catadores de materiais recicláveis, que o Pagamento por Serviços Ambientais Urbanos vai ser um extra para que esses trabalhadores possam ter uma vida digna e que "continuem fazendo esse grande serviço ao meio ambiente".
Ele ressaltou que a coleta do lixo deveria começar dentro de casa. Somente 3% do lixo doméstico é reciclado. Incluído o lixo industrial, esse percentual sobe para 11%. Quase a metade da meta do Plano Nacional sobre Mudança do Clima que prevê 20% de resíduo reciclado em 2015.
Logística Reversa
O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, disse ainda que a Política Nacional de Resíduos Sólidos, enviada ao Congresso Nacional em setembro de 2007, poderá ser votada na Câmara dos Deputados ainda este ano.
A política prevê a responsabilidade de quem gera o resíduo de fazer a logística reversa. No caso de fabricantes de refrigerantes, por exemplo, eles serão responsáveis pela reciclagem das embalagens pet.
Para isso, a política prevê um trabalho integrado dessas empresas com cooperativas de catadores, garantindo emprego e renda para as famílias.
A3P
Minc ainda falou que os órgãos públicos devem dar o exemplo à sociedade. Ele apresentou a Agenda Ambiental na Administração Pública (A3P) como forma de reduzir ao máximo o efeito das atividades realizadas no trabalho sobre o meio ambiente.
A A3P prevê a coleta seletiva de lixo e parcerias com cooperativas de catadores para a melhor destinação do material. Mais de 400 órgãos públicos participam da Rede A3P.
O Festival do Lixo e Cidadania é palco de manifestações políticas sociais e culturais, reunindo catadores de lixo, ambientalistas, estudantes e gestores de políticas públicas em debates e oficinas para debater importância dos catadores e de políticas públicas para o tratamento de resíduos sólidos.
Fonte: MMA, Por Carlos Américo, do MMA, disponível em http://www.rts.org.br/noticias/destaque-4/catadores-serao-beneficiados-com-o-pagamento-por-servicos-ambientais-urbanos, acesso em 14.02.2010

Veja a tabela de preços pagos por tonelada de material reciclável nas principais cidades brasileiras no site do CEMPRE: http://www.cempre.org.br/serv_mercado.php

Conheça o site do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis: http://www.mncr.org.br/

Catadores querem remuneração de municípios

Movimento organizado de catadores quer que prefeituras remunerem trabalhadores por serviços prestados. A proposta é de melhorar a parceria entre municípios e cooperativas para que a classe participe efetivamente da gestão dos resíduos sólidos urbanos (RSU).

A Lei Nacional de Saneamento Básico, n.º 11.445/2007, contém as diretrizes gerais que permitem a contratação direta desses trabalhadores pelos municípios. Entretanto, a aprovação do Projeto de Lei (PL), n.º 203/1991, que institui a Política Nacional de Resíduos Sólidos, garantirá o incentivo à criação e desenvolvimento de cooperativas por parte do poder público.

O PL, que tramita há 19 anos no Congresso Nacional, deverá ser aprovado ainda este ano, segundo o especialista em direito ambiental e consultor especial do Grupo de Trabalho que conduz o projeto, José Valverde.

O documento, segundo o especialista, está coeso, e deveria ter sido aprovado em dezembro. Entretanto, questões relacionadas ao Pré-sal e, mais recentemente, ao Plano Nacional de Direitos Humanos, atrasaram o agendamento de votação do projeto no Congresso Nacional.

O representante do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR), Roberto Laureano, destaca que a aprovação do PL aumentará as possibilidades de articulação das associações e cooperativas. E acrescenta que a classe já se prepara para concorrer as licitações de serviços municipais em pé de igualdade com as empresas privadas.

Estamos construindo um centro de referência de tecnologia e inclusão produtiva. A ideia é que seja lançado em março. Nesse centro teremos linhas para atuação de gestores públicos e de cooperativas, e com auxílio de advogados e juristas pretendemos criar um modelo de contração para trabalhar com as prefeituras, a partir de meios legais”, explica.

O centro contará, também, com mecanismos já lançados pelo MNCR, como o sistema Cata Fácil, software desenvolvido pelo movimento em parceria com a Universidade Federal de São João Del Rey, de Minas Gerais.

O objetivo será unir esse sistema ao um segundo software criado junto à Usina de Itaipu que promove a chamada “inteligência geográfica” que determinar as melhores rotas para os trabalhadores, além de evitar sobreposição de territórios de coleta.

Economia

O professor do Instituto de Tecnologia de Pernambuco e autor de estudo sobre a relação entre o desenvolvimento de organizações de catadores e sustentabilidade no Brasil, Bertrand de Alencar, destaca que a classe tem papel importante no setor de reaproveitamento de materiais no país.

Dados do Compromisso Empresarial para a Reciclagem (CEMPRE) revelam que a atividade de catação envolve diretamente cerca de 300 mil pessoas, mas o MNCR estima um número consideravelmente maior: entre 500 mil e 1 milhão de trabalhadores. Os catadores são responsáveis pela coleta de aproximadamente 10% dos materiais recicláveis gerados nos domicílios das grandes e médias cidades e por 3% dos resíduos depositados em lixões.

Ainda segundo o CEMPRE, a reciclagem movimenta anualmente no país R$ 8 bilhões. Alencar analisou também os impactos da atividade dos catadores na Região Metropolitana de Recife (RMR). O lixão de Muribeca, localizado na capital Fortaleza, recebe diariamente 3 mil toneladas de resíduos sólidos. Os catadores retiram aproximadamente 10 mil toneladas/ano do local. E outras 30 mil toneladas são retiradas anualmente das ruas da RMR.

“A atividade de catação reduz as importações de matérias-primas, possibilitando razoável economia de divisas no Brasil ao reduzir o volume de matérias-primas importadas”, completa. As garrafas PET, coletas em Recife pelos catadores, por exemplo, são exportadas para a Ásia e América do Sul após o processo de beneficiamento feito pela indústria Frompet, que adquire boa parte dos recicláveis desses trabalhadores.

Perfil do trabalhador

O pesquisador ressalta que ouve um crescimento “vertiginoso” da atividade de catação nos últimos trinta anos no Brasil, bem como dos problemas sociais relacionados à população que vive a partir da coleta de materiais.

“O perfil socioeconômico dos trapeiros [catadores] apresenta, como esperado, alto índice de analfabetismo, número de filhos acima da média, renda pessoal entre ½ e 1 salário mínimo para um período entre 8 a 10 horas diárias de trabalho, grande rotatividade na atividade, o desemprego como principal motivo para estarem catando materiais recicláveis e o trabalho como uma necessidade que os dignifica”, resume.

Os catadores desconhecem o significado e importância da atividade que praticam no contexto econômico e ambiental. Por outro lado, a organização da classe em cooperativas e associações tem contribuído para humanizar e profissionalizar os serviços. “Na atividade de catação de forma desorganizada há individualidade, indisciplina e um sentimento de autonomia por parte dos catadores”, analisa Bertrand de Alencar.

Organização

O primeiro Congresso Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis, realizado em Brasília, durante junho de 2001, foi decisivo na vida desses trabalhadores. O evento resultou em acordos com as entidades Fórum Nacional de Estudos sobre a População de Rua, Organização do Auxílio Fraterno (OAF), UNICEF, Pastoral de Rua e na criação do Movimento Nacional de Catadores de Materiais Recicláveis (MNCR).

Alencar destaca que após o Congresso Nacional houve o surgimento significativo de cooperativas e associações pelo país. “Levantamento que integra parte dos trabalhos de campo destinado a essa pesquisa de tese, identifica cerca de 500 cooperativas, associações e grupos em formação de catadores no país, das quais 78% surgiram depois do encontro de Brasília em 2001 e, um número estimado de catadores de 30 mil atuando em organizações formalizadas (cooperativas e associações) e/ou grupos em formação”, expõe no trabalho.

Mais tarde, no final de 2004, o MNCR dá importante passo ao articular e aprovar um projeto junto ao Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) em parceria com a Fundação Vida e Natureza (AVINA) e com a participação de instituições de apoio técnico.

O projeto incluiu o financiamento de uma ação coletiva de formação, capacitação e articulação nacional em 14 estados brasileiros que culminou na realização de um encontro nacional com a participação de mil catadores, aproximadamente. Na época, o grupo realizou uma marcha em Brasília até o Palácio do Planalto quando uma comissão de 30 catadores e apoiadores técnicos foi recebida pelo presidente Luis Inácio Lula da Silva e cinco ministros.

“Este projeto possibilitou a formalização das bases orgânicas do MNCR nesses estados e, sobretudo, consolidou a posição do Governo Federal no atendimento às reivindicações dos catadores”, sustenta Bertrand de Alencar.

O pesquisador destaca que o sucesso do movimento é baseado na elaboração de um estudo de abrangência nacional, pelo próprio MNCR em parceria com outras entidades, para identificar o custo da geração de postos de trabalho ao segmento de catadores nas cidades.

O trabalho apontou para uma demanda nacional de 39.040 postos de trabalho. Regularizar essas ocupações demandaria investimentos públicos na ordem de R$ 170 milhões, em cinco anos.

Abertura de créditos

Atualmente existem linhas de crédito do BNDES às cooperativas e catadores de materiais recicláveis. A proposta surgiu a partir de quatro encontros, sempre no mês de dezembro, e desde 2004, realizados entre a classe e órgãos federais, no Comitê Interministerial de Inclusão Social dos Catadores de Lixo.

No primeiro edital, lançado em 2006, o BNDES recebeu 127 propostas, que totalizavam R$ 36 milhões de recursos não retornáveis. O montante dessa carteira é destinado à realização de obras civis, compra de máquinas, equipamentos e assistência técnica.

Do total de projetos recebidos, 34 foram aprovados, no valor de R$ 22,9 milhões. Sendo o primeiro contrato assinado em 1/10/2007, no valor de R$ 16,4 milhões, para um grupo de 24 cooperativas dos estados Bahia, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Sergipe, São Paulo e Distrito Federal.

“O apoio do BNDES às cooperativas de catadores se insere no âmbito do Programa de Resíduos Sólidos do Programa Plurianual (PPA) do Governo Federal, tornando os catadores alvo de políticas públicas do Estado Brasileiro”, coloca Alencar.

Na segunda seleção, realizada em janeiro de 2008, o BNDES recebeu 42 novos – 21 deles pré-selecionados. Segundo o pesquisador, o maior entrave ao desenvolvimento das propostas está na exigência de documentação, “o que reflete por um lado o grau de precariedade da maioria das cooperativas, mas por outro o elevado nível do Governo Federal que não permite a ascensão de um número mínimo de pessoas pobres ao crédito”, avalia.

Os únicos financiamentos concretizados, até julho de 2008, foram das Cooperativas CAEC (Bahia), e Cooperativa de Produtos e Trabalhos de Reciclagem (CORTRAP), do Distrito Federal, que haviam participado do primeiro edital.

Apesar disso, Bertrand de Alencar, acredita que o MNCR soube articular de modo competente ações políticas públicas para a classe trabalhadora, “que vêm permitindo, senão alterar este quadro social desolador, mas apontar para possibilidades até pouco tempo atrás impensáveis”, conclui.

Para acessar o estudo na íntegra, clique aqui.

Obs: A pesquisa Perfil das pessoas que vivem dos materiais recicláveis coletados nas ruas da cidade de Campinas foi coordenada por Flávio Luiz Sartori e Eliete Sampaio e pode ser consultada em http://flavioluizsartori.blogspot.com/ - flavioluiz.sartori@gmail.com

Fonte: Portal Luis Nassif, http://blogln.ning.com/profiles/blogs/catadores-querem-remuneracao, acesso em 14.02.2010

TRABALHO E RECICLAGEM

A arte de enterrar dinheiro
Brasil perde US$ 10 bilhões a cada ano por não reaproveitar o lixo que produz. É como se fosse jogada fora toda a verba do Bolsa Família
MAURI KÖNIG
Diz o bom senso que rasgar dinheiro é sintoma de insanidade. O brasileiro não rasga, mas enterra. “É uma loucura real”, diz o economista Sabetai Calderoni. Doutor em Ciências Econômicas e diretor-presidente do Instituto Brasil Ambi¬ente, ele fez um estudo revelador: calculou a água e a energia gastas para transformar a matéria-prima virgem e comparou com os gastos para se chegar ao mesmo produto final se fosse utilizado material reciclado. Incluiu na conta os custos de transporte dos resíduos e as despesas com aterro sanitário. O resultado: o Brasil perde US$ 10 bilhões todos os anos por não recuperar todo o seu lixo.
Pelas contas de Calderoni, a cada ano joga-se literalmente no lixo uma quantia igual à do Bolsa Família, programa que socorre 50 milhões de pobres no país. O cálculo, analisado no livro Os bilhões perdidos no lixo, parte de bases concretas. A prefeitura de uma cidade de 200 mil habitantes, por exemplo, gasta em média R$ 8 milhões por ano com transporte de dejetos. Se reciclasse todos os resíduos sólidos, além de economizar os R$ 8 milhões ainda ganharia R$15 milhões com a reciclagem, inclusive dos restos orgânicos. Ou seja, gastam-se 8 para enterrar 15. No final, o ganho real seria de R$ 23 milhões.
Para Calderoni, a destinação do lixo já não é só um problema ambiental, mas também econômico, pois é necessário ir cada vez mais longe para descartar os resíduos, o que encarece a operação. Em São Paulo, o transporte representa dois terços dos gastos. “É como se gastasse uma fortuna para enterrar ouro”, diz. O lixo é matéria-prima, e tem de ser visto como tal. Para ele, estamos muito próximos da encruzilhada final. “Não há saída. Os aterros ficarão cada vez mais caros, a ponto de se tornarem inviáveis para qualquer prefeitura”, vaticina. O caminho? Usinas de reciclagem para reaproveitar tudo, de entulhos a orgânicos.
Com trabalhos na área de resíduos e meio ambiente reconhecidos internacionalmente, por meio de pesquisas ou como consultor da Organização das Nações Unidas, Calderoni diz que a solução é tão simples quanto evidente: estações de reciclagem integral do lixo, com várias soluções no mesmo espaço. “E um centro de reciclagem ainda tem a vantagem de ocupar uma área sete mil vezes menor que a de um aterro sanitário”, compara. Em uma cidade do porte de Curi¬tiba, por exemplo, diz que poderia haver uma central de reciclagem em cada ponto cardeal, reduzindo o custo do transporte.
Segundo Calderoni, não custaria mais do que R$ 10 milhões uma usina para reaproveitar todo tipo de resíduo, do lixo domiciliar ao entulho de construção, do caco de vidro à poda de árvores. “O melhor de tudo é que pode sair a custo zero para o município, bastando para isso uma parceria público-privada”, conclui. Matéria-prima não falta. Metade das 140 mil toneladas de restos gerados todos os dias no país ainda acaba nos lixões. O Brasil tem 1,5 mil desses lugares, a forma mais rudimentar no armazenamento de detritos, onde o lixo é jogado sem cuidado e sem tratamento.
Pelos dados do Diagnóstico do Manejo de Resí¬duos Sólidos Urbanos 2006, com informações de 247 municípios onde se concentra 50% da população brasileira, 61% do lixo coletado nessas cidades vai para aterros sanitários. Os aterros controlados, com uma estrutura melhor do que os lixões, mas onde há o trabalho de catadores, recebem 25% do lixo. Já o lixões ficam com 13,6% do material coletado, nos municípios que repassaram informações para o diagnóstico. Contudo, a amostra analisada representa grandes centros urbanos, enquanto a maioria dos lixões ainda está nas cidades pequenas e médias.
Em média, 55% do descarte em peso é de resíduos orgânicos, o que influi diretamente na disposição final em aterros, pois dificulta o gerenciamento, especialmente o tratamento do chorume e de gases oriundos da decomposição da matéria orgânica, que contribuem de forma significativa para o efeito estufa caso não sejam drenados. Apenas 14% dos brasileiros são atendidos com coleta seletiva, em 7% dos municípios, 83% deles no Sul e Sudeste. Já foi pior.
Há 15 anos, só 81 cidades faziam o serviço em escala significativa, chegando a 405 no ano passado. Em números absolutos, os brasileiros atendidos passaram de 25 milhões para 26 milhões entre 2006 e 2008, segundo pesquisa bianual da organização Compro¬mis¬¬so Empresarial para Reci¬cla¬gem (Cempre), principal fonte do país sobre coleta seletiva. Em Belo Horizonte e Porto Alegre, 100% da população contam com o serviço, seguidas de perto por Curitiba, Itabira (MG), Santos (SP) e Santo André (SP).
O setor de reciclagem movimenta no país R$ 8 bilhões por ano, podendo crescer em curto espaço de tempo se alguns gargalos forem eliminados. Dentre eles, o Cempre destaca a capacitação técnica, uma política fiscal/tributária coerente e o incremento da participação popular. Nesta fase, o que era lixo é transformado em matéria-prima, em novo insumo para a indústria, sendo reintroduzida no ciclo produtivo. No Brasil, a reciclagem de lixo urbano gira em torno de 12%. Alguns tipos de materiais apresentam índices equivalentes aos mais elevados do mundo, como as latinhas de alumínio, papelão e plásticos tipo pet.
Papelão e alumínio apresentam os mais elevados índices de reciclagem do país, de 77% e 94% respectivamente. Para os metais ferrosos, incluídas as embalagens, o país possui uma rede consolidada de sucateiros que alimentam algumas siderúrgicas, que em alguns casos chegam a operar com mais de 85% de matéria-prima oriunda do comércio de sucatas. O vidro, apesar de algumas restrições quanto ao transporte, também é reciclado em algumas partes do país. A fração mais significativa do que é coletado volta para as grandes vidrarias.
Embalagens longa-vida têm apresentado uma boa evolução no índice de reciclagem, impulsionada pelo reaproveitamento das fibras de celulose, de alta qualidade, por parte das indústrias de papel e papelão. A recente tecnologia de plasma, desenvolvida no Brasil, permite o aproveitamento do alumínio e do plástico também presentes na em¬¬balagem. Essa tecnologia está sendo exportada para Ásia e Europa e colocou o Brasil como líder mundial de reciclagem de embalagens longa-vida (24% em 2006) entre países em desenvolvimento.

Multa para quem não separa
Não separar o lixo reciclável de maneira correta dá multa em Curitiba. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente multou 627 pessoas, empresas e condomínios residenciais entre janeiro de 2006 e junho de 2009 por não colaborar com a coleta seletiva. Primeiro os fiscais orientam sobre a separação, o dia e o horário do caminhão de coleta do lixo orgânico e do reciclável. Cabe multa a quem não faz a separação correta ou a quem acondiciona os resíduos na lixeira fora do dia ou horário apropriados. As multas variam de R$ 250 a R$ 12,8 mil, no caso de reincidência. Quem não paga é incluído na dívida ativa do município.
Isso acontece porque o problema começa em casa, pois falta a cultura da separação para reciclagem. Cada brasileiro produz, em média, 920 gramas de lixo sólido por dia, mas a quantidade recuperada, seja na coleta seletiva, seja por catadores, chega a apenas 2,8 quilos por ano, ou ínfimos 7,5 gramas por dia por habitante. Isso significa que menos de 1% dos restos é reaproveitado. Os dados são os mais recentes do país, extraídos do Diagnóstico do Manejo de Re¬¬síduos Sólidos Urbanos, feito em 2006 pelo Sistema Nacional de Informação sobre Sanea¬mento.
Não sem motivo, o Ministério Público do Paraná está propondo aos municípios a criação de leis que tornem obrigatória a separação do lixo reciclável nas residências e empresas. “O cidadão não pode separar só pela sua consciência”, diz o coordenador da Promotoria de Proteção ao Meio Ambiente, Saint-Clair Honorato Santos. Daí uma lei para impor o melhor reaproveitamento dos resíduos. A proposta do promotor instigou o vereador Tico Kuzma, que saiu às ruas para investigar quanto os curitibanos estão desperdiçando. Vasculhou as lixeiras de seis bairros pouco antes da passagem do caminhão de lixo orgânico.
Na amostragem do vereador, 20% dos 70 quilos recolhidos eram plástico, papel, metais e vidros, ou seja, materiais recicláveis. Por essa média, conclui-se que algo em torno de 500 toneladas poderiam ser reaproveitadas em usinas de reciclagem caso fossem separadas em casa, bastando para isso usar a lixeira correta e prestar atenção ao dia e ao horário do caminhão da prefeitura. (MK)

Parques agrupam coletores
A prefeitura de Curitiba já pôs em funcionamento cinco dos 25 Parques de Reciclagem Eco¬cidadão previstos para dar a 2,5 mil coletores uma estrutura pa¬¬ra armazenamento, separação, pesagem e venda de materiais recicláveis. O programa profissionaliza o setor, retira o carrinheiro da marginalidade no mundo do trabalho. O material coletado é pesado individualmente e o dinheiro rateado entre os associados uma vez por semana.
Mais do que impedir que os catadores levem os detritos para suas casas, os barracões comunitários devem estimular o sistema de cooperativas e associações. Somente cooperados poderão fazer uso de equipamento, como forma de estimulá-los a se agregar, vencendo certas regras da informalidade.
Os galpões também minimizam danos ambientais, especialmente nos fundos de vale, onde grande parte do mundo do lixo de desenvolve. Com abrigos adequados para a estocagem, a tendência é mudar a cultura de reciclagem, hoje pautada no acúmulo de papel e plástico dentro das casas dos carrinheiros, além de reverter uma atividade que se constitui de forma solitária, imediatista, à mercê dos atravessadores e perpetuadora da miséria.
A prefeitura mantém ainda o programa Compra do Lixo em áreas onde não chegam os caminhões de coleta. Até quatro sacos vale uma sacola com um tipo de produto alimentício, como arroz, feijão, mel, batata, cenoura, cebola, alho e doce. Para cada saco de lixo, a associação de moradores recebe 10% do valor pago para aplicar em obras ou serviços definidos pela própria comunidade. Em outro programa, o Câmbio Verde, o lixo reciclável é trocado por hortigranjeiros. Cada 4 quilos de lixo valem 1 quilo de frutas e verduras. Podem ser trocados também óleo vegetal e gordura animal. (MK)