quinta-feira, 17 de julho de 2008

OCDE, muito criticada sobre os biocombustíveis, é favorável a uma moratória

A OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos) é favorável a uma moratória sobre os biocombustíveis e defende uma completa revisão das políticas atuais sobre o assunto, num relatório publicado nesta quarta-feira que critica o custo elevado dos combustíveis de origem vegetal e seu benefício ambiental duvidoso.

"Seria muito útil ter uma moratória, os programas atuais devem ser reconsiderados", declarou à AFP Stefan Tangermann, diretor para a agricultura e o comércio da OCDE.

No relatório, a OCDE destacou que as políticas de apoio aos combustíveis, muito caras, têm um impacto limitado sobre a redução das emissões de gases causadores do efeito estufa (GES) e sobre a melhoria da segurança energética.

Elas têm em contrapartida um "impacto significativo sobre os preços mundiais dos produtos alimentares".

Inicialmente tidos como uma ferramenta de luta contra o aquecimento climático, os biocombustíveis são agora amplamente denunciados (ONU, Banco Mundial, inúmeras ONGs) como uma das causas da disparada dos preços dos alimentos, porque distorcem os mercados dos produtos agrícolas necessários para sua fabricação.

"As novas iniciativas políticas só vêm agravando os problemas já existentes" e devem principalmente continuar favorecendo a alta dos preços agrícolas e acentuar os riscos de fome entre as populações mais pobres dos países em desenvolvimento, continuou o relatório.

A produção de etanol (cereais ou cana-de-açúcar) e de biocombustíveis (óleos vegetais) avançou rapidamente nos últimos anos e deve ainda dobrar nos próximos dez anos.

Os EUA são os primeiros produtores de etanol, com 48% da produção mundial em 2007, à frente do Brasil (31%), enquanto a União Européia lidera com 60% a produção mundial de biodiesel.

"Na maioria dos países, os biocombustíveis dependem fortemente dos subsídios públicos", mas particularmente nos Estados Unidos, Canadá e na União Européia, onde chegam a US$ 11 bilhões e devem atingir UU$ 25 bilhões daqui a 2013-2017, acrescentou o relatório da OCDE.

Os programa subvencionados nestas três grandes áreas vem provocando no entanto reduções apenas moderadas das emissões de gases do efeito estufa, da ordem de 1% do total das emissões devido ao setor dos transportes.

Se o etanol produzido a partir da cana-de-açúcar, como no Brasil, "reduz geralmente as emissões de gases causadores do efeito estufa em pelo menos 80% em relação aos combustíveis fósseis, os bicombustíveis produzidos à base de trigo, beterraba, óleos vegetais, ou milho como nos EUA, na Europa e no Canadá, reduzem as emissões em apenas 30% ou até 60%", continuou a organização.

A OCDE defende portanto a suspensão das barreiras aduaneiras sobre os biocombustíveis e das matérias usadas para sua produção, para reduzir seu custo e melhorar sua eficácia energética".

Ela recomenda também investimento em pesquisa sobre biocombustíveis de segunda geração, que usa resíduos agrícolas ou das plantas não alimentares.

Esta tecnologia não será operacional antes talvez de dez ano e deve a partir de agora precisar ainda mais de subvenções do que os combustíveis clássicos.

O relatório convida também à se concentrar em economias de energias, que permitem uma maior redução das emissões de gases do efeito estufa por um custo muito inferior ao desenvolvimento dos bicombustíveis. Pelas mesmas razões, a OCDE recomenda intensificar os esforços de redução das emissões em outros setores, como o da construção.

O desenvolvimento da produção de biocombustíveis em certas zonas tropicais merece no entanto ser analisado, ressaltou o relatório.

Fonte AFP

terça-feira, 1 de julho de 2008

“A economia solidária constrói o país que queremos”


Para Paul Singer, a economia solidária não é uma compensação ao padrão da economia capitalista e às regiões que não podem entrar nesta lógica, mas sim uma alternativa a este modelo.

Clarissa Pont

OLINDA – Secretário Nacional de Economia Solidária do Governo Lula desde junho de 2003, Paul Singer é capaz de captar histórias de todo o Brasil e apresentá-las com um otimismo único. Mal a Conferência terminou, pescadoras ribeirinhas de Minas Gerais, assentados da Bahia e trabalhadores rurais de Pernambuco cercaram o economista de origem austríaca para conversas, fotos e até autógrafos. Constrangido, mas munido de números e histórias de todo País sobre experiências desta inovadora alternativa de geração de trabalho e renda, Singer conversou com cada um dos presentes. Cena, aliás, que se repete a cada viagem e a cada vez em que ele fala em público para os verdadeiros protagonistas da economia solidária.

“A diferença entre o cooperativismo solidário e um pretenso cooperativismo do agronegócio não é só uma questão de escala, é uma questão de pulsão. A economia solidária não é uma compensação ao capitalismo e às regiões que não podem entrar nesta lógica, é a nossa alternativa”, disse. Singer atua dentro do Ministério do Trabalho e Emprego mantendo uma interlocução permanente entre setores do governo e da sociedade civil.

Para ele, “políticas que implicam em mudanças sociais profundas não podem ser feitas de cima para baixo, tem de ser feitas horizontalmente, com uma cumplicidade entre o agente público e ator social”. A Secretaria Nacional de Economia Solidária (Senaes) funciona em Brasília, mas o professor circula pelo Brasil. Seja na Teia que reuniu jovens de todos os Pontos de Cultura do País em Belo Horizonte, no ano passado, ou em bancas de pós-graduação na USP, o professor Singer viaja para garantir justamente essa cumplicidade presente na 1ª Conferência de Desenvolvimento Rural.

Ênfase na diversidade e limites ao latifúndio rural
Maria Emília Pacheco, da Federação de Órgãos para a Assistência Educacional e Social (FASE), dividiu a mesa com Singer. “O princípio da agroecologia é a diversidade agrícola e uma relação harmoniosa com a natureza. Os sistemas agroecológicos são diferentes em cada lugar, no Cerrado, no Pampa. Não há como haver uma massificação de produção”, resumiu Maria Emília.

Renato Maluf, presidente do Conselho Nacional de Segurança Alimentar, completou o painel e enfatizou que a alta dos preços dos alimentos não é conjuntural, mas parte de um modelo global. Para ele, a solução é proteger e incentivar a agricultura familiar. “Com a crise, a questão da soberania alimentar emergiu. A primeira questão é a dos preços, que tem impacto direto no orçamento das famílias. Isso prejudica o direito à alimentação das famílias mais pobres e que precisam de política social. No caso do Brasil, com a agricultura familiar responsável por uma parte substantiva da produção de alimento no Brasil, vira uma área estratégica”, explica Maluf.

Ele sublinha a agricultura familiar como alternativa por estimular a diversidade de biomas, de formas de produzir e de tipos de alimentos. “O agronegócio é parte da crise. Ele pode ser eficiente do ponto de vista produtivo, mas é dirigido a um número restrito de exportadores, é concentrador, agressivo ao meio ambiente e não gera empregos, como dizem”. Singer concordou com Maluf ao afirmar que o tamanho correto para uma área rural é aquele que delimita o pedaço de terra necessário para uma família plantar.