terça-feira, 25 de novembro de 2008

Brasil adere a acordo de sustentabilidade ambiental na Bacia do Prata


Ao participar do V Encontro Cultivando Água Boa e do Fórum de Águas das Américas, que começou no domingo (23) em Foz do Iguaçu (PR), o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, assinou a adesão do Brasil ao Acordo de Cooperação Técnica, Científica e Financeira do Centro de Saberes e Cuidados Socioambientais da Bacia do Prata.

O objetivo do acordo é a difusão dos conhecimentos científico e tradicional para promover a sustentabilidade socioambiental na Bacia do Prata. O acordo também visa a contribuir na criação de Rede de Educação Ambiental na Bacia do Prata, identificando mecanismos de articulação e cooperação para melhorar a sinergia entre governos e atores sociais.

Dos cinco países que formam a Bacia do Prata, somente os governos do Paraguai e da Bolívia haviam formalizado a adesão ao centro.

O Centro de Saberes é um espaço criado em 2006 pela Itaipu Binacional, Fundação Parque Tecnológico Itaipu, Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e Comitê Intergovernamental Coordenador dos Países da Bacia do Prata (CIC), para contribuir com ações de educação regional que respondam aos desafios socioambientais globais, regionais e locais, respeitando as diferenças e soberanias de cada país.

O MMA poderá ajudar financeiramente projetos na área e fazer acordos técnico-científicos com o centro, bem como estabelecer cooperação com os membros que aderiram ao acordo para o desenvolvimento e integração de ações na Bacia do Prata, dando suporte para o desenvolvimento de ações socioambientais na bacia.

A água é o centro de reflexão do acordo, que também tem como eixo a Bacia do Prata como território operacional; a educação ambiental como mobilizador social; e a construção coletiva de conhecimento, planejamentos, ações e organização.

Assinado durante V Encontro Cultivando Água Boa e do Fórum de Águas das Américas, que se encerra nesta terça-feira (25), o documento de adesão tem como base vários acordos firmados entre os ministérios do Meio Ambiente dos países integrantes da Bacia do Prata, Pnuma, CIC e Itaipu Binacional.

Esses acordos têm a água como tema prioritário para cooperação multilateral no que se refere à educação ambiental, com seus participantes se comprometendo a promover a participação da sociedade civil nas questões ambientais, a fim de criar hábitos de consumo consciente para alcançar o desenvolvimento sustentável.

Com 3,2 milhões de quilômetros quadrados distribuídos em quatro países, Brasil, Argentina, Bolívia, Paraguai e Uruguai, a Bacia do Prata tem 27 grandes represas com mais de 60 metros de altura e com capacidade superior a 100 megawatts de energia cada.

A Bacia do Prata é formada por dez rios: Uruguai, Paraguai, Iguaçu, Paraná, Tietê, Paranapanema, Grande, Parnaíba, Taquari e Sepotuba. (Fonte: MMA)


Movimentos sociais realizam plenária no Paraná

Mais de duzentos militantes participaram nesse final de semana da Plenária Estadual da Coordenação dos Movimentos Sociais – CMS/Paraná. A atividade ocorreu na Casa do Trabalhador, no Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores (CEPAT) em Curitiba, e reuniu importantes lideranças populares com o objetivo de debater a conjuntura, fazer avaliação das ações da CMS, e retirar encaminhamentos.

O coordenador do MST, João Pedro Stédile, fez uma analogia entre o futebol, a crise do mercado financeiro internacional e a ação dos movimentos sociais. “Quando há crise no modelo capitalista é o momento das massas se mobilizarem para não pagar a conta, preservar os empregos e avançar nas lutas, pois o nosso adversário de classe está mais enfraquecido. É como no futebol. Os times que estão mais fortes têm que ir pra cima dos que estão na parte de baixo da tabela e impor goleadas, isso se quiserem conquistar o título. De modo geral, quando existe crise no capital, a tendência é que as massas se levantem. Cabe a nós, dirigentes, estimularmos o reascenço do movimento popular a fim de unir forças e disputar o projeto de classes”.

O presidente da CUT no Paraná, Roni Anderson Barbosa, expôs sobre as novas descobertas de petróleo na camada do Pré-Sal e a necessidade da mobilização para garantir o monopólio da união sobre o setor. “É fundamental que o Brasil recupere a soberania sobre essas riquezas naturais que colocam o país como um dos três maiores detentores de reservas no mundo. Atualmente está nas mãos do capital privado e o Estado brasileiro precisa recuperar esse controle, pois é essencial para o desenvolvimento da nação. Por isso, peço o engajamento de todos na Campanha O Petróleo é do Povo Brasileiro e a Petrobrás Também, que visa recolher assinaturas no abaixo-assinado que irá encaminhar ao Congresso Nacional um projeto de lei de iniciativa popular para consolidar o monopólio do petróleo, a re-estatização da Petrobrás, com o fim das concessões para exploração das jazidas brasileiras de petróleo e gás, e a destinação social dos recursos”.

Na parte da tarde aconteceram os balanços da atuação da CMS no Brasil e Paraná. Antônio Carlos Spis, diretor da CUT Nacional e da CMS, afirmou que a avaliação consiste na reflexão que as ações da Coordenação são atemporais e objetivam a construção da luta de classe dos trabalhadores e do movimento social. “Aglutinamos forças para combater os problemas nocivos à população, como a política econômica neoliberal, o monopólio dos meios de comunicação, as concessões para exploração privada das reservas de petróleo, os latifundiários, entre outros”, destacou.

Gustavo ‘Red’ Erwin, membro da CMS-PR, fez a avaliação regional. “No começo de 2008 estabelecemos uma pauta prioritária, que inclui as lutas pela re-estatização da Vale do Rio Doce, a frente contra o agronegócio, a democratização dos meios de comunicação, a redução da jornada de trabalho sem redução de salários, e contra a criminalização dos movimentos sociais. Tivemos importantes avanços contra o agronegócio, sobretudo nas várias mobilizações contra os altos preços dos fertilizantes praticados pela Bungue/Fosfertil, e também envolvemos várias organizações e a sociedade na luta pela redução da jornada de trabalho. Por outro lado, não conseguimos avançar significativamente nas demais frentes. Agora, faço um apelo para que os movimentos do Paraná, principalmente os sindicatos, se envolvam em dois pontos: pelo fim da ocupação do Haiti, e pela abertura dos arquivos da ditadura e punição dos responsáveis pelos crimes de assassinato e tortura, pois trata-se de dolo de lesa humanidade, por isso são imprescritíveis”, destacou Red.

A plenária da CMS contou ainda com a presença do economista Luiz Filgueiras da Universidade Federal da Bahia (UFBA) que fez uma exposição sobre a natureza da crise mundial.
Matéria Publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos"

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Lula assina decreto que regulamenta Lei da Mata Atlântica


Em seu discurso na solenidade de assinatura do decreto que regulamenta a lei da Mata Atlântica, no hotel Hyatt, em São Paulo, hoje, o presidente Lula cobrou um maior envolvimento dos prefeitos na preservação do meio ambiente. “Ou nós envolvemos os prefeitos ou vamos ficar correndo atrás de fumaça”, disse Lula.

Segundo o presidente é preciso construir uma parceria para que o prefeito perceba a utilidade de ter uma política correta para o meio ambiente. Para ele é necessário dar uma outra visibilidade ao meio ambiente no país, já que para o mercado internacional ele pode ser considerado uma “vantagem comparativa” em relação aos outros países.

O decreto que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou regulamenta a lei 11.428/06 a Lei da Mata Atlântica, aprovada pelo Congresso Nacional após 14 anos de tramitação. Participaram da solenidade os ministros Carlos Minc, do Meio Ambiente e Reynold Stephanes, da Agricultura; o autor da Lei, deputado Fábio Feldman, a secretária de Biodiversidade e Florestas do MMA, Maria Cecília Wey de Brito, o presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, Rômulo Melo, além de representantes de organizações da sociedade civil, da academia, entre outros.

Apresentado em outubro de 1992, o projeto que se converteu em lei define os critérios de uso e proteção do bioma, reduzido atualmente a 7,3% de sua vegetação original, além de estabelecer uma série de incentivos econômicos à produção sustentável.

A lei cria também incentivos financeiros para restauração dos ecossistemas, estimula doações da iniciativa privada para projetos de conservação, regulamenta artigo da Constituição que define a Mata Atlântica como Patrimônio Nacional, delimita o seu domínio, proíbe o desmatamento de florestas primárias e cria regras para exploração econômica.

O decreto, assinado hoje, regula a lei e fortalece a consolidação da legislação sobre conservação, proteção, regeneração e utilização sustentável da vegetação nativa da Mata Atlântica. “Ele defende nosso bioma mais ameaçado. O decreto é o cumpra-se da lei e contribui para alcançarmos o desmatamento ilegal zero”, destacou Minc.

Segundo o ministro “é fundamental incorporarmos estados e municípios para que seja possível atingir a meta que é recuperar a vegetação e passarmos de 7% da cobertura vegetal original para 27%”.

Ele reforçou ainda a importância da elaboração de um mapa pelo IBGE definindo exatamente o tamanho da área protegida.

O decreto estabelece ainda procedimentos simplificados para o uso sustentável da Mata Atlântica para pequenos produtores rurais e população tradicional e estimula o plantio de espécies nativas para recuperação de áreas e também para a produção de matéria prima florestal para uso econômico.

Ele também dá segurança jurídica àqueles que vivem e exploram recursos do bioma, pois estabelece como e onde pode haver intervenção ou uso sustentável da Mata Atlântica.

A norma detalha os tipos de vegetação protegidos pela lei e delimitados no Mapa da Área de Aplicação, elaborado pelo IBGE, que será disponibilizado nos sítios eletrônicos do MMA e do IBGE amanhã. O mapa define as áreas de abrangência do bioma e delimita a aplicação da lei.

Outro ponto importante do decreto é que ele reconhece que as áreas anteriormente ocupadas legalmente por agricultura, pecuária, cidades ou qualquer outra atividade econômica não terão restrições adicionais. Ele também indica os requisitos mínimos para a elaboração do Plano Municipal de Conservação e Recuperação da Mata Atlântica, com o objetivo de envolver os municípios na conservação e recuperação da Mata Atlântica.

Por Daniela Mendes, da ASCOM MMA.

[EcoDebate, 22/11/2008]

domingo, 23 de novembro de 2008

Reunião do presidente com os movimentos sociais não pode ser de 'brincadeirinha' , diz Stédile

Sobre o convite do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para uma conversa com os movimentos sociais sobre a crise mundial, João Pedro Stedile, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ,disse: "Aproveito para mandar um recado: espero que a reunião não seja brincadeirinha para ele dar discurso para dirigentes de movimentos sociais, nós queremos uma reunião que seja um diálogo e que os movimentos possam dizer ao governo quais são as medidas que nós esperamos para sair dessa crise".

A reportagem é de Evandro Fadel e publicada no jornal O Estado de S.Paulo, 22-11-2008.

Depois de uma conversa com policiais militares paranaenses sobre o relacionamento da corporação com os movimentos sociais, Stédile afirmou que entende a posição do presidente Lula quando tenta amenizar o discurso em relação à crise para não criar um pânico. "Mas ele tem que tomar medidas práticas para proteger o povo brasileiro da crise", salientou. "Infelizmente até agora não vimos nenhuma medida concreta dirigida para os pequenos agricultores. Ao contrário, os pequenos estão começando a pagar a crise. E muito menos (vimos medidas) para o povo em geral."

Para o coordenador do MST, o governo federal está cometendo um "erro sério ao correr atrás do prejuízo e ficar setorizando a ajuda". Segundo ele, por enquanto o Estado foi revigorado não para ajudar o povo, "mas em benefício de salvar o patrimônio daqueles capitalistas que estavam especulando". "O que o Brasil precisa é tomar medidas de mudança de política econômica, precisa aproveitar a crise para sair do neoliberalismo e remontar um outro projeto de desenvolvimento nacional para o País", afirmou.

Para a reunião com o presidente Lula ele deve levar algumas propostas que acredita devam fazer parte da nova política econômica. A primeira é sair imediatamente da esfera do dólar. "Tirar as reservas de dólar e se proteger pelo menos em euro", sugeriu. Ao mesmo tempo em que propõe a articulação com países do Mercosul para construir uma moeda supranacional. Em relação à taxa de câmbio, Stédile espera que haja um controle por parte do governo e não deixá-la ao "sabor do mercado".



Segundo ele, o governo também precisa tomar "medidas drásticas" para controlar o fluxo de capital estrangeiro. "Os caras saem e entram como querem, isso aqui parece casa da mãe Joana", criticou. E, por último, deve sugerir que se acabe com a política de superávit primário, segundo ele "uma sacanagem que o Fundo Monetário Internacional nos impôs e que o governo Lula fecha os olhos".

Stédile acentuou que o superávit visa apenas o pagamento de juros. "Se os bancos estão quebrados essa é a hora de suspender o pagamento dos juros da dívida interna e usar o dinheiro para fazer um grande programa, como nos ensinou Roosevelt (presidente norte-americano Franklin Roosevelt) no New Deal (programa de desenvolvimento norte-americano após a crise de 1929), um grande programa de investimento naquelas áreas que vão solucionar o problema do povo: a reforma agrária, os pequenos agricultores, a construção de metrôs, a construção de moradias", propôs.

sábado, 22 de novembro de 2008

Rio de Janeiro recebe o Brasil Rural Contemporâneo


AGRICULTURA FAMILIAR


A X Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar do Mercosul (Reaf) e a V Feira Nacional de Agricultura Familiar e Reforma Agrária acontecerão entre os dias 22 e 30 de novembro. Reaf reunirá cerca de 300 representantes de Brasil, Argentina, Bolívia, Venezuela, Paraguai, Uruguai e Chile. Cerca de 10 mil produtos da agricultura familiar e dos assentamentos de reforma agrária estarão reunidos na feira.

Maurício Thuswohl

RIO DE JANEIRO – Após quatro anos consecutivos de bem-sucedida realização em Brasília, a Feira Nacional de Agricultura Familiar e Reforma Agrária está prestes a chegar ao Rio de Janeiro. De 26 a 30 de novembro, cerca de dez mil produtos oriundos da agricultura familiar e dos assentamentos da reforma agrária de todo o país estarão expostos em uma área de 25 mil metros quadrados na bela Marina da Glória. Aos pés do Pão-de-Açúcar, os produtos alimentares, de vestuário e de artesanato serão apresentados ao público em 464 estandes organizados por cooperativas, comunidades, territórios rurais e estados.

O universo da agricultura familiar, no entanto, já estará presente entre os cariocas a partir de sábado (22), quando terá início a X Reunião Especializada sobre Agricultura Familiar do Mercosul (Reaf). Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), o evento, que se estenderá até o dia 27 de novembro, reunirá no Hotel Guanabara, em pleno coração da cidade, cerca de duzentos representantes da sociedade civil, além de cem representantes dos governos de Brasil, Argentina, Uruguai, Paraguai, Chile, Bolívia e Venezuela.

A Reaf é realizada a cada seis meses com o objetivo de discutir e formular recomendações acerca de políticas, ações e projetos relacionados à agricultura familiar. Suas deliberações são encaminhadas ao Grupo Mercado Comum (GMC) e ao Conselho Mercado Comum e, caso sejam aprovadas, passam a ser implementadas no âmbito do Mercosul. Na reunião do Rio, o principal objetivo será a criação do Fundo da Agricultura Familiar do Mercosul (FAF Mercosul), que estará aberto à participação dos estados-membros e tem como objetivo financiar programas e projetos de incentivo à agricultura familiar do Mercosul.

Segundo o MDA, a contribuição anual de cada país para constituir o FAF Mercosul será composta por uma contribuição básica de US$ 15 mil, além de uma contribuição mínima de US$ 300 mil. Esta contribuição anual, de acordo com o ministério, será determinada conforme as seguintes porcentagens, estabelecidas com base na média histórica do PIB do Mercosul: Brasil (70%), Argentina (27%), Uruguai (2%) e Paraguai (1%).

Outro destaque da Reaf no Rio de Janeiro será a realização do Curso de Formação de Jovens Rurais que, até o dia 25 de novembro, reunirá cerca de 40 jovens brasileiros, argentinos, chilenos e uruguaios, todos integrantes de alguma organização representativa dos agricultores familiares em seus países. Segundo o MDA, o objetivo do curso é ser um espaço de diálogo político entre os jovens e de integração da propostas oriundas dos diversos países.

Na opinião do consultor da Assessoria Internacional e de Promoção Comercial do MDA, Francesco Pierri, a participação de jovens produtores rurais é a garantia do desenvolvimento de boas políticas para a agricultura familiar no futuro: “A melhor forma de criar esse debate é partindo dos jovens. Eles é que permanecerão no campo e são eles que demandam, neste momento, políticas públicas específicas. Por isso, acredito que temos que qualificar, organizar e tornar permanentes ocasiões como as proporcionadas nesse encontro”, diz.

Durante o Curso de Formação de Jovens Rurais, acontecerão três seminários, que irão discutir os impactos das mudanças climáticas sobre a agricultura familiar, o uso da terra por estrangeiros e a questão da segurança alimentar. O curso deverá também definir diretrizes para a busca pela igualdade de gênero nas políticas públicas voltadas para a agricultura familiar.

Ministro de Allende

A abertura oficial da Reaf, que acontecerá somente no dia 26 de novembro, será coordenada pelo ministro do Desenvolvimento Agrário do Brasil, Guilherme Cassel, e também terá a presença de Carlos Cheppi (secretário de Agricultura da Argentina), Ernesto Agazzi (ministro da Agricultura e Pecuária do Uruguai), Henry Moriya (vice-ministro da Agricultura e Pecuária do Paraguai), Gerardo Rojas (vice-ministro de Desenvolvimento Rural Integral do Ministério do Poder Popular para a Agricultura e Terras da Venezuela), Hernan Rojas Olavarria (diretor do Instituto Nacional de Desenvolvimento Agropecuário do Governo do Chile) e Alberto Alderete (diretor do Instituto Nacional de Desenvolvimento Rural e de Terras do Paraguai).

Também participarão da Reaf o gerente de Operações na América Latina e Caribe do Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida), Paolo Silveri, e o consultor de Desenvolvimento Rural Territorial da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), Rodrigo Castañeda. O ex-ministro da Agricultura do Chile no governo de Salvador Allende e ex-diretor do Instituto de Altos Estudos da América Latina da Universidade de Paris, Jacques Chonchol, fará uma palestra acerca dos efeitos da globalização sobre a agricultura de subsistência e o trabalho assalariado no campo.

Uma história de sucesso

Em sua quinta edição, a Feira Nacional da Agricultura Familiar e da Reforma Agrária espera repetir no Rio de Janeiro o sucesso obtido em Brasília. Nas quatro edições realizadas na capital federal, a Feira reuniu 1.798 empreendimentos agroindustriais e artesanais, que foram responsáveis pela movimentação de R$ 40 milhões e proporcionaram, nas Rodadas de Negócios, acordos entre 290 empreendimentos da agricultura familiar e 164 compradores, entre redes de supermercados, hotéis e restaurantes. Em quatro anos, cerca de 335 mil pessoas já visitaram os estandes ou participaram dos espetáculos e apresentações culturais promovidos durante a Feira.

Com o tema Brasil Rural Contemporâneo, a V Feira Nacional da Agricultura Familiar e da Reforma Agrária será dividida em estandes individuais e coletivos, distribuídos em cinco ambientes que reproduzem estilos e características das regiões Centro-Oeste, Norte, Nordeste, Sudeste e Sul. A Feira contará também com cinco ilhas temáticas, compostas por estandes coletivos que vão reunir de oito a 20 expositores. As ilhas são formadas pelas praças dos Orgânicos, da Biodiversidade, do Artesanato, da Cachaça e do Biodiesel. São espaços, segundo o MDA, “onde o visitante poderá ver, degustar e comprar direto de quem produz produtos de qualidade”.


Matéria publicada pela Agência Carta Maior:
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=15392&boletim_id=493&componente_id=8640

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Área para produção de biocombustíveis pode subir 54 milhões de hectares até 2014


Nos próximos cinco anos, o mundo necessitará de até 54 milhões de hectares a mais para atender ao consumo mundial de biocombustíveis, sendo que até 90% desse total virá da América do Sul. Essa demanda adicional por terras - ativo cada vez mais cobiçado - deverá ter impacto negativo para o ambiente, contrariando as discussões de preservação da biodiversidade e de redução de carbono. Matéria de Bettina Barros, do Valor Econômico, 20/11/2008.

Mas nem tudo está perdido. Uma saída viável seria canalizar esses milhões de hectares para áreas de pastagens e combiná-los com um modelo de pecuária intensiva. Isso poderia tornar o Brasil, maior produtor de biocombustível do continente, em um “modelo ambiental e uma superpotência agrícola a ser invejada pelo mundo”.

Essas são as principais conclusões do relatório divulgado pela organização ambiental The Nature Conservancy (TNC). Intitulado “Uma Oportunidade para o Brasil: Minimizando os Custos Ambientais da Expansão dos Biocombustíveis”, o estudo foi elaborado pela LMC International, consultoria de commodities agrícolas do Reino Unido, com o objetivo de quantificar o potencial da área destinada aos biocombustíveis em 2014.

A divulgação coincide com a realização da Conferência Internacional dos Biocombustíveis, e a data não é aleatória: o seminário promovido pelo governo tenta fechar o foco no etanol, apesar do nome. “O debate é mais que isso. O que dizemos é que a cana não desmata a Amazônia, e a soja sim”, diz Ana Cristina Barros, da TNC. O grão é a principal matéria-prima para produção de biodiesel no país.

O objeto de trabalho do relatório é o Cerrado. É neste bioma, que abastece boa parte do país de água e onde a soja se alastra, que a demanda por terra para biocombustíveis se concentrará. Com base em censos agropecuários de 1970 a 2006, os especialistas debruçaram-se sobre três cenários: manutenção do quadro econômico, comércio aumentado e crescimento mundial lento. Para comparação, foram usados dados de terras aráveis deste ano para produção de alimento/ração e biocombustíveis.

No primeiro cenário, onde os preços de energia continuariam altos e os governos manteriam a proteção dos setores agrícolas via tarifa de importação, a área mundial para biocombustíveis cresceria dos 31 milhões de hectares atuais para 85 milhões.

Com crescimento lento, cenário mais provável, a área atingiria 42 milhões de hectares. Na hipótese de melhora no comércio, onde os preços de energia continuariam altos, mas com redução de barreiras comerciais, a área passaria de 31 milhões para 58 milhões de hectares. A expansão seria menor, porque a redução de subsídios impulsionaria a produção de biocombustível para regiões eficientes e com disponibilidade de terra, diz David Cleary, diretor da TNC.

A questão central na expansão das terras para biocombustíveis é a pecuária. Nos últimos 20 anos, o país registrou queda gradativa de pastagens para áreas destinadas ao plantio. Ao mesmo tempo, a concentração de cabeças de gado por hectare subiu. Se essas linhas continuarem, diz o estudo, os impactos ambientais serão menores.

“Teoricamente, a expansão do biocombustível nos pastos desmatados acomodaria toda a demanda futura de terra a um custo baixo em termos de conservação e biodiversidade”, conclui o estudo.

[EcoDebate, 21/11/2008]

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Movimentos sociais, ambientais e de direitos humanos criticam atual modelo do agronegócio de biocombustíveis


Organizações sociais, ambientais e de direitos humanos criticam o atual modelo de exploração do agronegócio da energia e das grandes monoculturas energéticas, como da cana-de-açúcar, voltadas para a exportação. Elas afirmam que discordam radicalmente do modelo e da estratégia de promoção dos “agro-combustíveis”.

Durante três dias, elas se reuniram para discutir os problemas e impactos do modelo atual da produção de agro-combustíveis, no Seminário Internacional Agro-combustíveis, em São Paulo.

No documento elaborado por organizações da Colômbia, Bolívia, Costa Rica, Bélgica, El Salvador, Equador, México, Argentina, Alemanha, Estados Unidos, Holanda, Suécia e do Brasil, dizem que a agricultura industrial para a produção de de biocombustíveis é insustentável, pois apenas se viabiliza através da expansão das monoculturas, da concentração de terras, do uso intensivo de agroquímicos, da super-exploração dos bens naturais comuns como a biodiversidade, a água e o solo.

Segundo a coordenadora da organização não-governamental Amigos da Terra, Lúcia Ortiz, o objetivo do documento, que será entregue a representantes de todos os governos que participam da Conferência Internacional de Biocombustíveis que também ocorre em São Paulo, é expressar a posição das organizações participantes do seminário como um contra-ponto à promoção dos biocombustíveis realizada na Conferência Internacional de Biocombustíveis. “É um documento contrário à expansão do agronegócio da energia e das grandes monoculturas energéticas voltadas exclusivamente à exportação”, disse.

O texto elaborado pelos debatedores também coloca a produção em escala industrial de biocombustíveis como causa para os desmatamento e destruição de ecossistemas em todo o mundo, e, especialmente da Amazônia, além de outros biomas do Brasil.

Em outro item do documento, as organizações criticamos financiamentos públicos para esse tipo de cultura, afirmando que o setor sucro-alcooleiro, no Brasil, não se sustenta sem o financiamento público, e que a promoção dos programas governamentais de biocombustíveis é caracterizada por incentivos e subsídios governamentais diretos, como os do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e indiretos, como a não penalização das evasões fiscais e perdão de dívidas.

Por fim, elas entendem que a soberania energética “não poderá ser alcançada em detrimento da soberania alimentar”, e que se requeira uma nova organização do modo de vida em sociedade e das relações entre campo e cidade.

“Não aceitamos a idéia de que é possível haver sustentabilidade com os biocombustíveis, porque a cana invade as áreas das florestas e bosques e é responsável pelo trabalho escravo”, explica Gilmar Pastorio, coordenador de Política Agrária da Federação Nacional dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura Familiar do Brasil (Fetraf). Segundo ele, os biocombustíveis são responsáveis por substituir a matriz de alimentos para gerar energia. “Deixamos de produzir carne e feijão para fazer o etanol é um absurdo.”

Para Pastorio, o zoneamento proposto pelo governo federal não será capaz de equilibrar a produção no país. “Esse zoneamento é uma piada porque o governo não poderá delimitar as áreas que podem e não podem ser da cana.”

Uma das soluções apontadas pelos movimentos é repensar as novas formas de consumo e produção de energia. De acordo com Pastorio, a produção do etanol polui tanto quanto a extração de petróleo. “O biocombustível não vai salvar o planeta. Temos que reduzir o excesso de produção e de desperdício da energia para produzir melhorias climáticas”, afirma.

De acordo com Alexandre Calderón, representante da Rede Mexicana de Accón Frente Al Libre Comércio (RMALC), as soluções para preservar o planeta que não sejam baseadas na produção dos biocombustíveis são simples: diversificar as matrizes energéticas e investir em energia eólica e solar. “Reduzir o transporte individual e diminuir distâncias dos centros produtores para os consumidores já é um passo.”

O coordenador da Fetraf pontua que a agricultura familiar deve ser fortalecida e não sobreposta à produção de biocombustíveis. “É preciso ter a soberania alimentar neste país. Os biocombustíveis são responsáveis pela alta dos preços dos alimentos.”

O secretário-executivo da Secretaria Geral da Presidência da República, Antonio Roberto Lambertucci, recebeu o documento e prometeu encaminhar as reivindicações aos ministérios da Agricultura, do Trabalho e outros interessados. “O diálogo com os movimentos sociais é uma das prioridades do governo Lula”, ressalta.

Matéria composta com textos de Flávia Albuquerque e Ivy Farias, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 20/11/2008.

Conferência sobre os biocombustíveis. 'Uma grande feira de negócios'. Entrevista especial com Lucia Ortiz



Entrevista concedida para o Instituto Humanitas Unisinos

Finalizada ontem, a 1ª Conferência Internacional sobre Biocombustíveis, promovida pelo governo brasileiro, foi, segundo a ambientalista Lucia Ortiz, “uma grande propaganda do etanol”. O evento não contou com a presença do presidente Lula, de outros chefes de Estado e não oportunizou que acordos fossem fechados sobre o biocombustível produzido a partir do etanol. “Foi uma grande feira de negócios”, disse Lucia, ao analisar a presença de muitos empresários desse setor. Lucia esteve presente nesta conferência e também no evento paralelo organizado pelos movimentos sociais para discutir o modelo da política brasileira em relação à produção ao etanol.

Lucia Ortiz é coordenadora do Núcleo Amigos da Terra e do GT Energia do Fórum Brasileiro de Ongs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento. É geóloga e mestre em Geociências.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – A Conferência Internacional sobre Biocombustíveis: os biocombustíveis como vetor do desenvolvimento sustentável é patrocinada pelo governo brasileiro. Em sua opinião, o governo pretende com esse evento?

Lucia Ortiz – A pretensão do governo, ao unir esforços, investir e promover esse evento, foi a de conquistar uma aceitação do etanol brasileiro no mercado internacional. Ou seja, expandir seu mercado de exportação de commoditie agrícola energética, principalmente em relação ao etanol, que é produzido a partir de grandes cultivos agroindustriais. Por isso nós chamamos de agrocombustíveis. Em contraposição a esse conceito, a conferência do governo chama de biocombustíveis, como vetor do desenvolvimento sustentável, expressão da qual discordo.

Era esperada a presença de chefes de Estado de nível ministerial, pelo menos, nessa conferência, mas isso não se confirmou. O que estamos vendo no evento oficial é a presença de níveis mais baixos de representação dos governos e uma grande feira de negócios. Existem muitos empresários que estão fazendo uma grande promoção desse setor. A questão da crise financeira afetou a não vinda dos chefes de Estado, mas alguns países não viram aqui oportunidade de firmar acordos ou lançar algum projeto de padronização. Outros países entenderam essa conferência mais como uma grande propaganda do etanol do que uma oportunidade de fazer grandes negócios.

IHU On-Line – Por que você discorda da idéia em torno do biocombustível?

Lucia Ortiz – Eu não concordo com essa tese porque penso que a estratégia de promoção dos agrocombustíveis, utilizada pelo governo brasileiro, tem como base a expansão das monoculturas voltadas à exportação. As monoculturas para os agrocombustíveis se somam a todo o modelo do agronegócio que está em franca expansão e tem impactos diretos e indiretos sobre a redução da biodiversidade, em razão dos deslocamentos de populações tradicionais de pequenos e médios agricultores que de fato produzem o alimento da população brasileira. Eles são ainda são responsáveis pelas mudanças do uso do solo, pelo desmatamento e, desta forma, contribuem para o aquecimento global. Como se destinam para abastecimento da indústria automobilística que prioriza o transporte individual e precisa de insumos que envolvem muita energia para ser produzida, eles alimentam um modelo de transporte e de produção agrícola que é altamente impactante para o clima. Por isso, as mudanças climáticas devem ser resolvidas com mudanças mais estruturais.

IHU On-Line – Os movimentos sociais fizeram um evento paralelo ao oficial, qual o conteúdo das discussões e os objetivos dessa iniciativa?

Lucia Ortiz – Nós tivemos um encontro que reuniu mais de cem pessoas de vários países da América Latina, também dos Estados Unidos, Europa e até da Ásia. Tivemos uma representatividade muito boa e que se reuniu por três dias com o objetivo de avaliar um pouco a conjuntura da crise financeira. Nós a entendemos como uma crise de modelo de civilização, pois estamos vendo a crise climática, a crise energética, a escassez da água e, ainda, a crise financeira que mostra que esse modelo econômico está acabando com o nosso capital natural, a nossa base da vida. A partir desse contexto, nós analisamos a estratégia que o governo quer empurrar e nos aprofundamos na análise dos impactos e as estratégias para minimizá-los. Fizemos críticas específicas e num segundo momento apresentamos nossas propostas para construção da soberania energética e alimentar. É um conceito que se opõe ao discurso e ao conceito do governo.

IHU On-Line – A crise mundial desfocou o debate em torno da crise climática que cada vez mais ganhava espaço ou se trata de oportunidade que poderá alavancar ainda mais o debate sobre a crise ambiental?

Lucia Ortiz – Com certeza, ela é uma oportunidade porque mostra um colapso desse nosso modelo, desse padrão de consumo e produção, de acumulação de riquezas e distribuição desigual e que é baseado no desperdício excessivo de energia. Então, ela traz muitas oportunidades de reflexão e de repensar os modos de vida no campo e na cidade, e centrando nas necessidades reais das pessoas. Por outro lado, vemos que o governo está muito preocupado com o impacto da crise financeira para suas metas de crescimento econômico. É possível que o governo, através dessa crise, para estimular a economia, mesmo aplique recursos públicos nos seus projetos num objetivo de gerar empregos, acelerar a economia apesar a crise. Estamos vendo duas coisas: uma oportunidade de reflexão e de construção de alternativas, mas vemos que a intenção do governo ainda está indo em outro sentido, apostando ainda mais no mercado de exportação, não tanto no que a população precisa.

IHU On-Line – O modelo de política que está sendo realizada para os biocombustíveis será afetado pela crise financeira?

Lucia Ortiz – Imaginávamos que sim, mas, como o próprio governo está investindo forte nesse setor, a crise não afetará a intenção do governo. O que pode afetar é a retração dos mercados que iriam importar. Em duas semanas, uma decisão muito importante será tomada no Parlamento da União Européia em relação à aprovação ou não de metas compulsórias de substituição de combustíveis fósseis por agrocombustíveis. Se eles aprovarem, todo o combustível será importado, pois eles não têm terra para isso. Por isso, as soluções para conter o problema do clima vão recair sobre os países menos responsáveis pelas mudanças. E a intenção do Brasil é avançar nesse setor.

IHU On-Line – Os biocombustíveis afetam a soberania alimentar?

Lucia Ortiz – Sim, porque na medida em que o agronegócio avança, inviabiliza a produção da agricultura familiar, que é a base da soberania familiar no Brasil. O avanço dos agrocombustíveis afeta diretamente sobre o pequeno produtor que sai do meio rural e vai para a cidade. Com isso, nós acabamos importando alimentos ou massificando a nossa dieta alimentar porque não valorizam uma alimentação diversificada e saudável e, principalmente, mais amigável para o meio ambiente.

Manifesto dos Movimentos Sociais: Agrocombustíveis como obstáculo à construção da soberania



Os agrocombustíveis, como o etanol, são parte de um modelo agrícola que não produz alimentos e, ao contrário do que afirma o governo, aumenta os impactos ambientais, através do desmatamento e da queima da cana-de-açúcar, além de gerar outras conseqüências sociais, como o uso de trabalho escravo nas lavouras.

As terras dedicadas a essa produção, que poderiam ser destinadas à reforma agrária e à produção de alimentos, têm sido compradas por grandes grupos estrangeiros e empresas do agronegócio, que recebem um volumoso apoio do Governo Federal, através de créditos e isenções fiscais.

Leia abaixo a carta final do “Seminário Internacional Agrocombustíveis como obstáculo à construção da Soberania Alimentar e Energética”, que manifesta a posição dos movimentos sociais e organizações populares de 14 países sobre o tema, e foi entregue hoje durante a conferência governamental de agroenergia.

Seminário Internacional Agrocombustíveis como obstáculo à construção da Soberania Alimentar e Energética

São Paulo, 17 a 19 de Novembro de 2008

Nós, organizações e movimentos sociais do Brasil, Argentina, Colômbia, Costa Rica, Bolívia, El Salvador, México, Equador, Paraguai, Tailândia, Holanda, Suécia, Alemanha e Estados Unidos, reunidos em São Paulo de 17 a 19 de Novembro de 2008.

Discordamos radicalmente do modelo e da estratégia de promoção dos agrocombustíveis: entendemos que estes não são vetores de desenvolvimento, nem tampouco de sustentabilidade. Esta estratégia representa um obstáculo à necessária mudança estrutural nos sistema de produção e consumo, de agricultura e de matriz energética, que responda efetivamente aos desafios das mudanças climáticas.

Afirmamos que:
O modelo de agricultura industrial, onde se inserem os agrocombustíveis, é intrinsecamente insustentável, pois apenas se viabiliza através da expansão das monoculturas, da concentração de terras, do uso intensivo de agroquímicos, da superexploração dos bens naturais comuns como a biodiversidade, a água e o solo. Os agrocombustíveis representam uma grave ameaça à produção de alimentos. Independentemente dos cultivos utilizados para a produção de energia, comestíveis ou não, trata-se da competição por terra agricultável e por água.

A produção em escala industrial de agrocombustíveis, ao expandir a fronteira agrícola, soma-se à expansão do conjunto do agronegócio – cujos impactos dinâmicos e efeitos cumulativos são o principal vetor de desmatamento e destruição de ecossistemas em todo o mundo, e no Brasil é responsável pela destruição da Amazônia, do Cerrado e outros.

No Brasil, o setor sucroalcooleiro não se sustenta sem o financiamento público: a promoção dos programas governamentais de agrocombustíveis historicamente tem sido caracterizada por incentivos e subsídios governamentais diretos (como financiamentos públicos do BNDES, em grande parte oriundos do FAT) e indiretos (como não penalização das evasões fiscais e perdão de dívidas).

O setor sucroalcooleiro conta com a conivência do governo quanto ao descumprimento das legislações trabalhistas e ambientais: Entre os impactos da produção de etanol no Brasil destacamos a superexploração e as condições degradantes de trabalho e a utilização de mão de obra escrava; a contaminação dos solos, do ar e da água e redução da biodiversidade; o encarecimento das terras e a concentração fundiária, que fragilizam ainda mais os programas de reforma agrária e promovem, concomitantemente, um processo brutal de invasão de territórios de populações tradicionais e povos indígenas e de expropriação das terras de pequenos e médios agricultores; e a ameaça à produção dos alimentos que são consumidos no país. A extrangeirização da terra, seja através da compra ou contratos de arrendamento, para a produção de agroenergia, também é um fator recente e extremamente preocupante, pois hipoteca as áreas de terras agriculturáveis disponíveis e as condições estruturais de produção de alimentos.

Denunciamos que a estratégia de difusão internacional do modelo agroenergético do governo brasileiro, através da ação de seus ministérios, em especial o Itamaraty, e instituições financeiras e de pesquisa, como BNDES e Embrapa, reproduzirá os impactos e problemas do setor nos países da África, América Latina e Caribe.

Questionamos a estratégia de expansão dos agrocombustíveis através do mercado global: Nos opomos radicalmente ao acordo de difusão tecnológica Brasil/EUA, que visa a padronização e comoditização do etanol. Nos opomos às metas de substituições de combustíveis na União Européia e nos EUA que ampliarão a demanda por terras para produção de agrocombustíveis nos países do Sul.

Alertamos que nem o zoneamento, nem critérios ambientais e sociais irão tornar sustentável o modelo do agronegócio exportador: As propostas de certificação socioambientais dos agrocombustíveis, a tomar por experiências diversas (como FSC, RTSPO, RTSB), não minimizam, mas escamoteiam os impactos, servindo majoritariamente como um instrumento de legitimação do comércio internacional. O zoneamento agroecológico da cana proposto pelo governo brasileiro, assim como a difusão de conceitos como o de terras ociosas, degradadas ou marginais, legitima a expropriação dos territórios para a expansão das monoculturas e oculta os conflitos sociais.

Reafirmamos nossa luta de mais de uma década contra os transgênicos: o avanço dos agrocombustíveis, do etanol de segunda geração e da produção de bioplásticos inclui um componente estrutural de biotecnologia, transgenia e biologia sintética, fatores que representam uma nova frente de ameaça à biodiversidade.

O atual modelo de produção e consumo, promovido pelos países do Norte é insustentável e coloca em risco a vida do planeta. Diante da crise estrutural do sistema capitalista, que engloba a questão energética, ambiental, alimentar, financeira e de valores é preciso repensar o modelo de sociedade e de civilização.

Defendemos como proposta alternativa a soberania energética, que não poderá ser alcançada em detrimento da soberania alimentar:

A soberania energética e alimentar é o direito dos povos de planejar, produzir e controlar a energia e os alimentos nos seus territórios para atender as suas necessidades:
- Requer uma nova organização do modo de vida em sociedade e das relações entre campo e cidade.
- Pressupõe um sistema alimentar calcado na reforma agrária em bases ecológicas adaptada as particularidades de cada bioma, como real alternativa aos problemas da escravidão no campo, da superexploração dos trabalhadores rurais e de concentração e acesso a terra; o fortalecimento do campesinato e das economias locais; a valorização dos hábitos alimentares e culturais; a diminuição das distâncias entre produção e consumo e relações solidárias de comércio.

Este sistema é também menos dependente, mais eficiente pode ser autosuficiente em energia. É mais apropriado e resistente e é a real solução para a crise climática, provocada pelo modelo agroindustrial petro-dependente que é reproduzido na estratégia dos agrocombustíveis, a qual nos opomos.

A soberania energética pressupõe um modelo de produção e consumo de energia e de transporte baseado na racionalidade e economia, através da mudança nos atuais padrões de consumo, na diminuição dos fluxos planetários de bens e energia do sistema econômico globalizado, e em modelos de mobilidade que priorizem o transporte coletivo, público e de qualidade em detrimento dos automóveis individuais. Pressupõe a substituição de combustíveis fósseis por fontes renováveis de energia produzida de forma descentralizada e para atendimento das demandas locais, bem como o apoio de assistência técnica e desenvolvimento de pesquisas voltadas aos interesses dos povos.

O preço da energia deve ser baseado no custo da produção real e não na especulação financeira.Tampouco pode estar sob controle de grandes grupos econômicos.

A soberania alimentar e energética está calcada nos princípios da democracia e da descentralização, com participação popular no planejamento e tomadas de decisões e gestão da produção de alimentos e energia, incluindo o cesso e controle sobre os fundos públicos, e da solidariedade entre os povos, considerando as diferentes potencialidades, necessidades e soluções apropriadas em cada país ou região.

A energia e os alimentos são direitos dos povos, nos são dados pela terra, pela água e pela diversidade da natureza, não podem ser tratados como mercadorias.

Movimentos e entidades brasileiros organizadores:
Via Campesina Brasil – MMC, CPT, MPA, MAB, FEAB, CIMI, PJR, MST
ABRA – Associação Brasileira de Reforma Agrária
Amigos da Terra Brasil
ANA – Articulação Nacional de Agroecologia
Assembléia Popular
CESE - Coordenadoria Ecumênica de Serviços
CONTAG - Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura
CTB – Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil
CUT – Central Única dos Trabalhadores
FASE
FBOMS – Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e
o Desenvolvimento
FERAESP – Federação dos Empregados Rurais Assalariados do Estado de São Paulo
Fórum Carajás
FETRAF - Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar
Instituto EQUIT
Intersindical
Jubileu Sul Brasil
Marcha Mundial das Mulheres
Plataforma BNDES
REAPI – Rede Ambiental do Piauí
RBJA - Rede Brasileira de Justiça Ambiental
REBRIP – Rede Brasileira pela Integração dos Povos
Rede Alerta contra o Deserto Verde
Rede Economia e Feminismo
Rede Social de Justiça e Direitos Humanos
Rede Educação Cidadã
Repórter Brasil
SPM - Serviço Pastoral Dos Migrantes
Terra de Direitos

Internacionais:
ActionAid
African Center for Biosafety, South África
Aliança Social Continental
ATALC – Amigos da Terra América Latina e Caribe
CEO – Observatório Europeu de Corporações
CIECA - República Dominicana
Cone Sul Sustentável
FIAN - FoodFirst Information & Action Network
FOCO - Foro Ciudadano de Participación por la Justicia y los Derechos
Humanos - Argentina
Food and Water Watch
Fundação Heinrich Boell
Global Forest Coalition
Global Justice Ecology Project, USA
Grito Dos Excluidos/As Continental
IFG – International Forum on Globalization
Misereor
Oilwatch
OWINFS – Rede Nosso Mundo Não Está à Venda
Oxfam
RALLT – Red por una América Latina Libre de Transgénicos
Rede Internacional de Gênero e Comércio
The Oakland Institute, USA
WRM – Movimento Mundial pelos Bosques Tropicais

* Manifesto enviado pelo MST Informa n° 156 - 19/11/08

sábado, 8 de novembro de 2008

Oposição e a Mídia da burguesia completamente desconcertada com o salto tecnológico da Venezuela


DEBATE ABERTO

O satélite Simon Bolivar deixa a crítica fora de órbita

Desconcertada com o salto tecnológico da Venezuela, a oposição de direita dirigida desde Miami, tentou reduzir a importância do lançamento do satélite Simon Bolivar. Primeiro sonegou, não informou. Porém, a Venezuela hoje já possui um sistema público de comunicação bastante expressivo e a Telesur transmitiu ao vivo o lançamento a partir de território chinês.

Carlos Alberto de Almeida

O lançamento do satélite Simon Bolívar pela Venezuela na semana que passou, numa cooperação tecnológica com a China, manda literalmente para o espaço e deixa fora de órbita a crítica anti-chavista, seja na lá como aqui no Brasil, onde alguns jornais, na impossibilidade de esconder completamente o acontecimento, embora quisessem, tentaram ironizar o fato de Hugo Chávez ter qualificado o novo aparato tecnológico como satélite socialista.

A pobreza da crítica é estarrecedora, obtusa e chega mesmo a escorregar para algo similar às chamas da Inquisição Medieval que queimaram Giordano Bruno e chegaram a chamuscar Galileu. Ou seja, é perigosa, revela a estatura político-intelectual dos responsáveis pela linha editorial desses meios de comunicação que deveriam funcionar como serviços públicos em sintonia com a Constituição.

Primeiramente, vale revelar que a mídia venezuelana, seguindo como vassala a mídia norte-americana, sonegou a informação da entrada da nação bolivariana na era satelital. Por si só, esta sonegação informativa constitui afronta a todo o patrimônio cultural da humanidade.

Desde quando Karl Marx bradou a legítima pretensão dos revolucionários de “assaltar os céus”, numa referência aos comuneiros da Comuna de Paris que, cercados, sem água e sem alimentos, chegaram a beber sua própria urina e comer ratos para defender o sonho de tirar a humanidade da penumbra do atraso social capitalista. E com que dignidade defenderam este sonho, esta rebeldia. Hoje, através do satélite Simon Bolívar, o brado de “assaltar os céus” transforma-se cada vez mais em realidade que só os processos revolucionários podem conseguir. Assim foi também quando décadas depois de abrir uma nova era na história da humanidade, a Revolução Russa, após resistir a todos os ataques terroristas do capitalismo, às invasões de exércitos imperialistas, a todas manipulações desinformativas mais grosseiras, lançou o Sputnik, fazendo com todo o mundo reconhecesse a imensa capacidade sócio-econômica e tecnológica do novo modelo de sociedade.

Este é o infinito significado histórico do satélite Simon Bolívar: a Revolução Bolivariana é um fato concreto e está seguindo aquele caminho dos comuneiros de “assaltar os céus” . Esta simbologia histórica é ainda mais importante quando o satélite é lançado a partir de uma cooperação com a República Popular da China que há pouco mais de meio século atrás era conhecida pelas epidemias de fome, pelo atraso cultural e o analfabetismo, pela possibilidade de se comprar mulheres e animais nas feiras, por um obscurantismo tão atroz que a própria acupuntura era proibida. Anos depois da Revolução Socialista conduzida por Mao, a China é hoje um país com presença no espaço sideral, também está “assaltando os céus”, transformou-se no maior produtor de computadores do mundo e ainda oferece a cooperação tecnológica para os países com menor desenvolvimento. Vale registrar que 150 engenheiros venezuelanos estiveram durante anos participando desta verdadeira façanha de colocar em órbita o Simon Bolívar.

Mesquinhez informativa

Completamente desconcertada com o salto tecnológico da Venezuela, a oposição de direita dirigida desde Miami, tentou várias táticas para reduzir a importância do episódio. Primeiro sonegou, não informou. Porém, a Venezuela hoje já possui um sistema público de comunicação social bastante expressivo e a Telesur – A nova televisão do Sul - transmitiu ao vivo o lançamento a partir de território chinês. Aqui no Brasil a TV Cidade Livre de Brasília, a TV Paraná Educativa e a TV Comunitária do Rio de Janeiro também transmitiram integral ou parcialmente a entrada da Venezuela, por meio de uma decidida política estatal, na idade dos satélites.

Fracassada a tática da sonegação, a mídia do capital tentou criticar os “gastos excessivos” feitos no satélite que trás o nome do libertador e integrador das nações latino-americanas, tal como o satélite também poderá fazer a partir de agora, colocando-se à disposição de outras nações da região, sobretudo àquelas que sofrem bloqueios e sabotagem do imperialismo norte-americano, como Cuba e Bolívia, já convidadas por Hugo Chávez a compor o projeto satelital. Nesse sentido, os investimentos de 400 milhões de dólares revelam-se uma ninharia se comparados ao significado histórico de ser uma ferramenta que permitirá fantástica dinamização econômica, cultural e social da região. Nesse sentido, o Simon Bolívar é sim uma ferramenta socialista. Além de que, os críticos terminam por tomar as dores do seleto clube de satélites, do qual a Venezuela se liberta agora, com enorme economia para seus cofres públicos.

Demolida esta tática, a outra crítica inventada pela mídia do capital é a de que o satélite será usado para o terrorismo. A mesquinhez aqui não tem limites! Todos sabemos que a carnificina feita pelos EUA no Iraque teve ampla cobertura satelital, seja para orientar seus mísseis assassinos na destruição de cidades e mais cidades, seja para a prática do “terrorismo midiático” por meio de qual se “justificou” esta matança selvagem, com o uso da mentira sobre a existência de “armas de destruição em massa”, hoje completamente desmascarada. Para bombardear a Yugoslávia, os EUA e a Otan, chegaram mesmo a desligar o canal de tv de Belgrado do satélite, já que esta informava e revelava as mentiras sobre a suposta existência de campos de concentração , outra mentira utilizada para esquartejar aquela brava nação do Adriático.

Com o Simon Bolívar, os países que buscam um caminho independente do caos financeiro-social traçado pelo neoliberalismo já tem um instrumento a mais para afastarem-se das redes de controle informativo/desinformativo do grande capital. Canais públicos de rádio e televisão já não mais precisam estar sujeitos aos satélites controlados pelos conglomerados midiáticos capitalistas, novas condições para políticas de comunicação públicas estão abertas e a integração informativo-cultural do sul é cada vez mais uma realidade concreta, visto que era meta impossível sob a ditadura do capital midiático.

Ameaça ou exemplo?

O salto tecnológico da Venezuela é também uma lição muito profunda para a consciência nacionalista do povo brasileiro, sempre atacada pela mídia controlada editorialmente pelos vassalos dos interesses imperiais no Brasil. As repetidas críticas às políticas implementadas por Hugo Chávez no país vizinho, tendem sempre a sinalizar a existência de uma ameaça chavista aos interesses nacionais. Esta tese, tal como a das “armas de destruição em massa”, nunca foi comprovada. Mas, os jornais e tvs a repetem frequentemente, como repetiram aquela anterior.

O jornal New York Times pelo menos teve a atitude de reconhecer, em editorial, anos após o banho de sangue no Iraque, que jamais pode comprovar que existiram as tais armas e que foi usado pelos planejadores da bárbara agressão militar. Claro, seus anunciantes são os principais acionistas da indústria bélica....

E aqui? A mídia reconhecerá que se enganou nestes anos todos diante das transformações em curso na pátria de Bolíviar ou seguirá praticando não-jornalismo e afirmando que a Venezuela é ameaça ao Brasil? A Unesco reconheceu que a Venezuela é hoje um país livre do analfabetismo, e isto jamais foi notícia na mídia brasileira! A Venezuela paga hoje o mais elevado salário mínimo da América Latina e isto nunca foi notícia aqui! Venezuela e Cuba associaram-se para operar de catarata a 6 milhões de latino-americanos, gratuitamente, em dez anos, e isto nunca foi notícia na mídia verde-amarela! Será que são fatos irrelevantes???

Quando o governo venezuelano, sob constantes ameaças de golpe de estado e intervenções externas, passou a reaparelhar suas forças armadas (como Lula pretende reaparelhar corretamente as brasileiras), soaram mais alto as vozes que falam em “ameaça chavista”, sempre com espaços generosos na mídia. Mas, quando a Colômbia, que é o país proporcionalmente mais bem armado da região, recebeu 600 tanques dos EUA a título de combate à guerrilha, estas vozes ficaram em silêncio. Sequer balbuciaram jornalísticamente se é possível combater guerrilhas nas selvas com tanques??? Quando a Venezuela se propôs a comprar 150 aviões Tucanos do Brasil, transação comercial vetada pelos EUA, estas mesmas vozes sequer resmungaram qualquer crítica ou dúvida acerca das ameaças que tal proibição representa aos interesses da indústria nacional, nem sobre a prática do livre comércio, aqui violada.

Quando as próprias autoridades confessam não ter hoje o Brasil capacidade militar para defender, por exemplo, o petróleo pré-sal ou os tesouros da Amazônia de algum “espertinho” aventureiro, como disse Lula, como é que se pode reprovar que um país vizinho esteja reconstruindo sua industria de defesa e desenvolvendo soberanamente o que considera pertinaz para defender suas imensas riquezas energéticas e sua soberania? Não seria mais indicado que tais condutas fossem tomadas como exemplo e não como ameaças? Parece que o presidente Lula já entendeu desta forma, tanto é que determinou a liberação de vultosos recursos para o projeto do submarino nuclear brasileiro, decisão rigorosamente realista para qualquer país que tenha uma costa do nosso porte e que sofreu anos de demolição da indústria bélica e de sucateamento neoliberal de sua Armada, inclusive com a privatização de sua Marinha Mercante. Os oligopólios navais transnacionais até hoje agradecem....

Por fim, como pode um país com a economia e o território do porte que temos não dispor de uma empresa pública de satélite? Vale lembrar que os que vivem a alardear a tal “ameaça chavista” nunca comprovada, apoiaram frenéticamente a farra da privataria que levou a Embratel a se transformar em uma empresa sob controle de capitais norte-americanos. Para se perceber a gravidade deste fato, basta citar que até mesmo informações militares brasileiras hoje dependem da operação de satélites controlados por capitalistas norte-americanos.!!! E ainda há aqueles que por candura eqüina ou por cinismo admitem que num momento de conflito, como os que têm ocorrido no planeta, as informações de interesse nacional que trafegam por estes satélites serão preservadas corretamente “porque os contratos serão cumpridos”.

Aliás, tanto isto não é verdade como já ocorreu situação em que os interesses nacionais não foram preservados: em reunião dos acionistas do Consórcio Satelital Intelsat surgiu a oportunidade de aumento da participação acionária do Brasil, mas tal oportunidade simplesmente não foi comunicada ao Estado Brasileiro pela tal empresa agraciada com a Embratel na farra privateira. Este episódio, juntamente com o exemplo edificante do lançamento do Simon Bolívar, deve promover a necessária reorientação desta nefasta privatização, que precisa ser revertida e seus operadores devidamente responsabilizados.

Por que os que ficam a acenar com fantasmas de supostas ameaças de um governo que tem sido correto colaborador do governo brasileiro não advertem para os interesses nacionais verdadeiramente ameaçados por estarem as informações militares brasileiras sob controle de uma empresa norte-americana???

Como indicado, o lançamento do satélite Simon Bolíviar é uma enorme lição para a consciência nacionalista brasileira. Se pretendemos de fato construir um projeto soberano de Nação - e muitas decisões governamentais acerca da nacionalização do novo petróleo e da recuperação da indústria da defesa sinalizam nesta direção - não podemos ter dúvidas sobre o que é realmente exemplo e o que é ameaça. E neste mundo de sombras, incertezas e violência, não temos o direito de vacilar sobre a imperiosa necessidade de buscar independência tecnológica e de sonharmos sim, como Nação, em “assaltar os céus” , como um dia “assaltou” um ilustre brasileiro, Alberto Santos Dumont. Mas, nem sempre nossas políticas de ciência e tecnologia e de comunicação públicas estão à altura de seu gesto grandioso. E se dependesse de uma certa mídia colonizada, nunca estarão. Nada mudaria e o espaço sideral seria como um latifúndio a mais. Mas, para contrariar tais visões imutáveis, tal mesquinhez informativa, ai estão os câmbios na Venezuela, no Equador, na Bolívia, na Nicarágua, no Brasil , na Argentina.

E aí está satélite Simon Bolíviar trazendo de volta Galileu Galilei e dizendo ao mundo inteiro “Eppur si muove” !!!


Carlos Alberto de Almeida é presidente da TV Cidade Livre, de Brasília.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Propostas da Central Única dos Trabalhadores para energia, desenvolvimento e soberania



Sindicatos


Central entrega ao governo federal suas reivindicações e propostas para o pré-sal, os agrocombustíveis e o etanol. Veja o documento
Raquel Camargo
Central lista todas suas propostas e reivindicações para o pré-sal, biocombustíveis e etanol


Uma comissão da CUT entregou ao governo federal na tarde de quarta (1°), em audiência com o ministro Luis Dulci, da Secretaria Especial da Presidência, um documento oficial em que lista todas suas propostas e reivindicações para o pré-sal, biocombustíveis e etanol. A comissão foi formada pelo presidente Artur Henrique, pelo secretário nacional de Finanças, Jacy Afonso, e pelo diretor executivo José Lopez Feijóo. A audiência teve início às 15h30.

Veja, a seguir, a íntegra do documento:

Energia, desenvolvimento e soberania - as propostas da CUT

A energia tem sido um dos temas mais debatidos recentemente no país, suas potencialidades e impactos na consolidação de um projeto de desenvolvimento para o Brasil. As últimas descobertas do petróleo - pré-sal - potencializam o debate, especialmente pelas implicações geopolíticas.

O setor de energia é considerado um dos mais relevantes para a sustentação do ritmo de crescimento em longo prazo. O potencial das últimas descobertas de petróleo no país, na camada pré-sal, motiva um grande debate sobre o modelo de exploração dessas reservas e o destino a ser dado a esses recursos. Também tem sido motivo de grande debate a expansão da produção agrícola de biocombustíveis, incluindo as preocupações com as questões de segurança alimentar, de zoneamento agrícola, a compra de terras por estrangeiros, a segurança hídrica, a indução ao desmatamento, o trabalho degradante, infantil e análogo ao escravo.

Estes elementos colocaram para a CUT - Central Única dos Trabalhadores, que representa boa parte dos trabalhadores(as) dos segmentos diretamente envolvidos o desafio de intervir nesse debate e nessa disputa de modelos de desenvolvimento, sob a ótica do desenvolvimento sustentável, com distribuição de renda e valorização do trabalho.
Considerando a necessidade de que a matriz energética mundial contemple fontes renováveis e não poluentes de energia, que não venham a agravar a fome no mundo e o aquecimento global do planeta, solucionando aspectos equivocados dos modelos de desenvolvimento, altamente poluidores, hoje adotados por uma parcela razoável de países desenvolvidos ou em desenvolvimento e até mesmo mudanças de paradigmas;

Considerando que o Brasil, por seu potencial energético, por sua posição geográfica, pela disponibilidade de terras agricultáveis e pelo domínio da tecnologia, alcançada nos últimos 30 anos, desempenhará um papel de destaque neste cenário;

Considerando, ainda, que os agrocombustíveis são uma nova fonte de energia com possibilidades importantes em termos de alternativa energética mais limpa e que tem amplo potencial de inclusão social e de acesso a mercados externos, a partir da premissa do desenvolvimento e da justiça socioambiental;

A CUT defende as seguintes propostas:

1 - Uma política energética que garanta a soberania nacional, a sustentabilidade de sua produção e uso, o respeito e a promoção dos direitos sindicais, trabalhistas e sociais dos trabalhadores desses setores, bem como a participação dos trabalhadores e da população na definição de suas diretrizes, que tenha como seu horizonte a integração regional da América Latina. Nesse sentido, consideramos fundamental que o acordo EUA e Brasil, de cooperação para a expansão do etanol, seja revisto, promovendo amplo debate na sociedade, que envolva os trabalhadores, os movimentos sociais, a comunidade acadêmica e científica.

2 - Garantir a realização e consolidação de Zoneamento Agroecológico, com participação e controle da sociedade, em todo o Território Nacional, contemplando a produção de alimentos, de oleaginosas, de cana-de-açúcar, de soja, de pastagens; as áreas de preservação ambiental e as áreas para Reforma Agrária visando evitar maiores agressões ambientais e a implantação da atividade canavieira em áreas necessárias à proteção dos ecossistemas e em regiões estrategicamente importantes para a produção de alimentos, tendo em vista a estratégia de garantir a segurança alimentar;

3 - Garantir a execução de uma Reforma Agrária ampla e massiva que responda às necessidades urgentes de implantação e consolidação dos assentamentos de trabalhadores rurais;

4 - Garantir a implantação e o monitoramento, com a participação dos trabalhadores(as), na concessão e na manutenção do Selo Combustível Social ou Certificação Social;

5 - Garantir a ampliação, a desburocratização e o acesso ao crédito com redução das taxas de juros para a agricultura familiar e para os pequenos agricultores, prioritariamente.

6 - Garantir a universalização dos serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural (ATER) para a Agricultura Familiar, em especial para os grupos produtivos de mulheres e jovens;

7 - Apoiar o desenvolvimento das cadeias produtivas da agricultura familiar e economia solidária e criar mecanismos de fomento para estimular as cooperativas desses segmentos para ter maior acesso aos mercados;

8 - Garantir a limitação dos investimentos de capital e a aquisição de terras por estrangeiros ou por empresa brasileira com participação de capital estrangeiro;

9 - Garantir o estabelecimento de metas de contrapartidas sociais (proteção social e ambiental) para os financiamentos públicos e privados e para as isenções fiscais;

10 - Garantir a implantação e financiamento de programas de qualificação e requalificação profissional com a participação dos trabalhadores na gestão;

11 - Apoiar e garantir o combate permanente ao trabalho degradante, escravo e infantil no campo.

Com relação ao PETRÓLEO, defendemos a imediata suspensão de todos os leilões; o estabelecimento de um novo marco regulatório para o petróleo da camada pré-sal, que garanta ao Estado brasileiro e à Petrobras a exploração - o que inclui a condução do ritmo de extração das reservas, conforme estratégia de médio e longo prazo - e a comercialização e distribuição; definição de políticas para fortalecimento e criação de cadeias produtivas de fornecedores de equipamentos e tecnologia para a Petrobras e de refino e industrialização do petróleo extraído; a criação de um fundo subordinado ao Estado brasileiro, com controle social, com a função de gerir os recursos advindos do pré-sal e para decidir seu destino, com prioridade para projetos de educação, saúde, pesquisa e tecnologia, infra-estrutura, segurança e cultura.

Por isso, lançamos a Campanha Nacional "ENERGIA É SOBERANIA - o pré-sal é nosso", iniciando com um abaixo assinado da FUP/CUT - Federação Única dos Petroleiros, encaminhando ao congresso nacional Projeto de Lei de iniciativa popular, nos termos do Artigo 61, parágrafo 2°, da Constituição da República, visando à consolidação do monopólio estatal do petróleo, a reestatização da Petrobras, com o fim das concessões para exploração das jazidas brasileiras de petróleo e gás, e garantindo a destinação social dos recursos gerados por esta atividade.

Para o BIODIESEL, pela convicção de que este possa representar uma oportunidade para a agricultura familiar, defendemos que o Programa Nacional de Produção de Biodiesel crie, efetivamente, as condições para a consolidação de uma agricultura familiar autônoma e inserida em toda a cadeia, com políticas de acesso ao crédito para a produção de matéria-prima; políticas públicas específicas que promovam a construção de mini-usinas; a produção de sementes de qualidade; a difusão de tecnologia apropriada; a implementação de ações de assistência técnica, formação e qualificação; incentivo ao associativismo e à cooperação; desenvolvimento de programas de subsídios, seguros e preços mínimos; a inclusão de jovens e mulheres e políticas de produção e abastecimento local de energia, através de arranjos produtivos que promovam o desenvolvimento local e regional e a criação do Fundo Nacional de Promoção da Agricultura Familiar no PBPB, por meio da retenção de R$ 0,01 (um centavo de real) por litro de B2 comercializado para apoio à agricultura familiar, pesquisa sobre produção de oleaginosas pela Agricultura Familiar e outras iniciativas;

Já para o ETANOL, entendendo que sua ampliação contribui para sustentar a expansão dos países pobres inaugurando uma nova dinâmica de independência comercial, é essencial que se promova uma vigorosa alteração nas relações de trabalho. Para tal, propomos no âmbito das políticas públicas o cumprimento de cotas mínimas de produção de açúcar de forma que o cultivo da cana para a fabricação do etanol não provoque desabastecimento e pressão sobre os preços; iniciativas com vistas a permanência dos trabalhadores e trabalhadoras do setor da cana em seus estados de origem; a garantia de os recursos do BNDES destinados ao financiamento de diversos elos da cadeia produtora dos agrocombustíveis sejam acompanhados de contrapartidas sociais e trabalhistas; estímulo a formação de APLA - Arranjos Produtivos Locais para a produção de álcool, integrando os vários elos da cadeia produtora como parte de uma política de fortalecimento do desenvolvimento regional; a definição de padrões e normas para a produção e exportação do etanol brasileiro, em que a Petrobras exija certificação social e ambiental para seus fornecedores de álcool combustível bem como o desenvolvimento de parcerias com o setor patronal e órgãos públicos de programas de qualificação e requalificação profissional, especialmente para os trabalhadores afetados pela mecanização. No âmbito das relações de trabalho, propomos a adoção do Contrato Coletivo Nacional, contemplando o contrato de trabalho com registro em carteira de trabalho, eliminando desta forma todo tipo de contratação precária seja através das coopergatos ou outras formas de intermediação; a eliminação da terceirização na contratação; a remuneração mínima unificada para todos os trabalhadores na lavoura canavieira; o pagamento por produção, definido a partir de uma meta mínima diária executável, considerando as condições de terreno e tipo de cana; a garantia de fornecimento gratuito de equipamentos de proteção, segurança e ferramentas de trabalho; a assistência médica permanente nos locais de trabalho; o transporte seguro e gratuito para o local de trabalho; alojamento e alimentação gratuitos para todos os trabalhadores e trabalhadoras, de acordo com padrões estabelecidos em legislação e/ou OIT; a jornada de trabalho de 40 horas semanais e 8 horas diárias com intervalos para descanso e a imediata eliminação do trabalho infantil e trabalho análogo à escravidão.

Direção Executiva Nacional da CUT e entidades filiadas
30 de setembro de 2008

Fonte: CUT

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Rio Grande do Norte dá a largada na produção de biodiesel a partir de girassol


Rio Grande do Norte dá a largada na produção de biodiesel a partir de girassol

Por Riomar Trindade, da Agência Brasil

Rio de Janeiro - A entrega de uma extratora de óleo vegetal ao assentamento Canudos, em Ceará-Mirim, marcou o início do Programa de Biodiesel da Petrobras no Rio Grande do Norte a partir de girassol. O contrato foi firmado com um termo de cooperação entre a Petrobrás e a Cooperativa dos Produtores de Canudos (Copec), um investimento de R$ 350 mil. É a primeira máquina extratora do estado voltada para grãos de girassol.

O maquinário tem capacidade de gerar 120 litros de óleo de girassol por hora, beneficiando diretamente 500 famílias agrícolas e 100 famílias na utilização de co-produtos do grão.

Um dos produtos gerados é a torta de girassol, usada na criação de caprinos e ovinos, bem como na alimentação de tilápias criadas em tanques.

O principal resultado econômico para a Copec é a agregação de valor à produção dos pequenos agricultores: eles vão comercializar o óleo de girassol, mais valioso que a semente, para a produção de biodiesel.

A extratora, que recebeu isenção de ICMS pelo governo estadual, utiliza uma tecnologia de extração a frio, ambientalmente correta, sem usar caldeiras e, portanto, sem fazer uso de lenha. Isso contribui para melhoria e preservação do meio ambiente. No Rio Grande do Norte funcionam a Usina Experimental de Biodiesel I e a Unidade Experimental de Biodiesel II. Juntas, elas já receberam investimentos de R$ 20 milhões e produzem 20,4 mil toneladas/ano.


(Envolverde/Agência Brasil)

Alimentos, inflação e energia - Do contexto e do método

Por Henrique Rattner*

A análise e interpretação das informações sobre a “crise de alimentos”, ou melhor, da “segurança alimentar”, na conjuntura e no contexto histórico atual exigem uma abordagem sistêmica e interdisciplinar. Diagnósticos convencionais baseados em um raciocínio linear, cartesiano, não permitem o entendimento de toda a complexidade dos problemas, dos diversos atores e de seus interesses conflitantes, que caracterizam o cenário atual nacional e internacional.

Não basta explicar a alta de preços dos “commodities” e dos insumos para sua produção recorrendo ao modelo convencional de interação entre demanda e oferta. Além dos aspectos econômicos relacionados com a segurança alimentar, análises de natureza sócio-política, ambiental e, sobretudo, ética, são freqüentemente omitidas, embora se revelem fundamentais para a compreensão da dinâmica dos processos e dos atores intervenientes e seus interesses conflitantes.

Em outras palavras, as indagações de natureza sócio-ambiental e ética – “para que, para quem e a que custo?” devem constituir a base de qualquer proposta de ação pública e privada.

O que está em jogo nas estratégias de poder, em nome da proteção do meio ambiente e da segurança alimentar – condições básicas para toda a população, sobretudo as mais carentes – que conferem significado ao proclamado “desenvolvimento sustentável”?

Os meios ecológicos e éticos são sistematicamente ignorados pelos grupos de poder, com graves conseqüências para o futuro do planeta e da imensa maioria de seus habitantes.

A sociedade está em processo permanente de metabolismo com a natureza e os homens transformam, através de suas atividades, os diversos ecossistemas. A destruição contínua do meio ambiente que se realiza em grande escala é o resultado de uma determinada forma de organização social que está na origem dos processos de degradação da natureza e de um enorme contingente de seres humanos.

A irracionalidade dessas relações reflete-se tanto no plano macro do sistema sócio-econômico quanto na relação micro da economia industrial das empresas.

No nível macro, a corrida insaciável atrás da acumulação, concentração e valorização do capital leva a formas de produção e consumo insustentáveis. Em nível micro, a concorrência entre as empresas e sua busca por mais lucros mediante a redução de custos e elevação da produtividade resulta inevitavelmente em efeitos desastrosos no meio ambiente (queimadas, poluição dos solos e da água) e na sociedade (exploração de trabalho em condições subumanas na indústria sucroalcooleira). Os custos de produção não são efetivamente reduzidos, mas transferidos para a sociedade, sob forma de desemprego, pobreza e marginalidade social além da devastação de ecossistemas que, em última análise, afetam as condições climáticas e colocam em risco a própria sobrevivência da humanidade.

No contexto político atual, a preocupação com o clima (efeito estufa) e a proteção da natureza é considerada um “luxo”, enquanto os problemas da pobreza e marginalidade são transferidos, na melhor das hipóteses, a organizações filantrópicas e de caridade.

Os economistas continuam a insistir em modelos e indicadores para equacionar o crescimento econômico apesar das amargas evidências de sua inadequação e, freqüentemente, mistificação, com relação à distribuição de renda efetiva.

Segundo estatísticas oficiais, 25% da população controla 75% do produto mundial e 0,2% se apropria de 50% da riqueza global. Quinhentas empresas transnacionais dominam praticamente todos os setores de atividades econômicas, além de manter a supremacia absoluta nos mercados financeiros. No paradigma econômico atual, nem os governos, nem as empresas têm poder de regulamentação e de controle suficiente sobre os fluxos ininterruptos de transações financeiras virtuais, cujo valor representa um múltiplo da produção efetiva.

É esta estrutura de poder e seu funcionamento que constituem limites ao crescimento econômico e inviabilizam a proteção e conservação dos recursos naturais. A sustentabilidade do sistema será alcançada somente com uma distribuição mais eqüitativa do produto social – os bens materiais e simbólicos.

Atualmente, o consumo de um barril de petróleo resulta em três toneladas de dejetos; o consumo de 1m³ de madeira implica em 3m³ de madeira perdida e a plantação de 1ha de soja resulta em 20 toneladas de solo comprometido.

Por isso, necessitamos de um novo paradigma em que a otimização no uso de recursos leve ao máximo de bem estar, com menos degradação de recursos naturais. As análises que enfatizam as inovações tecnológicas como alavanca do crescimento econômico ignoram que essas são apropriadas e controladas por organizações poderosas, em busca de maximização do retorno sobre seus investimentos.

O discurso oficial sobre sustentabilidade evita explicitamente aspectos fundamentais do contexto e das tendências da sociedade contemporânea, tais como a globalização da economia e das finanças, que permeia todas as esferas da vida social e cultural; a distribuição assimétrica da informação e do acesso a bens materiais e simbólicos e, sobretudo, das relações de poder entre e dentro dos países

Em conseqüência, o sistema parece implacável em sua dinâmica: os ganhos beneficiam os ricos, enquanto aos pobres é vedado a acesso à cidadania e aos direitos humanos básicos, devendo contentar-se com as esmolas e as políticas paternalistas compensatórias. Em suma, o sistema é autodestrutivo à medida que seu funcionamento depende da degradação de recursos humanos e naturais, comprometendo assim a própria existência e sobrevivência.

A Crise Alimentar e os Biocombustíveis

Nas semanas passadas, ocorreu uma série de protestos e revoltas populares que se estenderam desde Bangladesh, Filipinas e Haiti até a África Ocidental, por causa do aumento dos preços dos alimentos básicos, assinalando que a era de alimentos baratos passou. Um número crescente de países, em sua maioria africanos, enfrenta situações explosivas porque os pobres não conseguem mais comprar o mínimo de seus alimentos básicos. Tanto os preços de arroz quanto do trigo subiram desde 2006 em mais de 150% e, com isto, elevou-se o índice de inflação em todo mundo. Quais as causas desse fenômeno de conseqüências trágicas para centenas de milhões de pessoas?

China e Índia, dois dos países emergentes, incorporaram ao mercado centenas de milhões de novos consumidores que antes viviam numa economia de auto-suficiência, que atualmente estão nos mercados urbanos, com poder de compra mais elevado, e que consomem maiores quantidades de grãos e até carne. Nos países ocidentais, a produção de biocombustível (etanol) à base de milho causa falta desse alimento para a população e para a produção pecuária.

Quarenta e oito países impõem controle de preços, subsídios aos consumidores e restrições à exportação de grãos para assegurar a cesta básica de alimentos às camadas mais pobres de sua população. A inflação de um conjunto de produtos básicos – aço, fertilizantes, resinas e sementes - leva a um aumento contínuo dos preços de commodities. No fim da cadeia produtiva, isso resulta em aumento dos preços dos alimentos.

Tanto os subsídios aos agricultores quanto a especulação nas bolsas de commodities nos países ricos distorcem os preços e inviabilizam a produção para pequenos agricultores. Por outro lado, o aumento contínuo do preço do petróleo repercute nos custos de insumos básicos para a lavoura, tais como fertilizantes, defensivos, maquinários e também sementes.

Como conseqüência, expande-se um círculo vicioso de inflação contaminando todo o sistema produtivo e aumentam as pressões para a incorporação de terras virgens à produção de alimentos. Mas, de acordo com as regras do mercado, a produção de etanol à base da cana disputa o aproveitamento de terras para incrementar o plantio de outros cultivos, menos rentáveis. Outro empecilho para o aproveitamento de terras virgens é o custo da terra, que aumentou significativamente nos últimos anos, junto com os preços de insumos, como fertilizantes, sementes, máquinas e agrotóxicos, que sofrem pressões constantes pelo aumento da demanda.

A expansão do cultivo da cana-de-açúcar para produção de etanol tende a competir com a produção de alimentos e estimular o avanço sobre as áreas de pasto e da soja, além de pressionar pela incorporação de terras como o cerrado e outros biomas virgens, sensíveis à poluição. No Brasil, a expansão de cultivo da cana para etanol tem se concentrado em São Paulo e no Mato Grosso, causando em muitos lugares a expulsão de pequenos lavradores, incapazes de competir por causa dos custos cada vez mais elevados dos insumos.

Em vez de produzir etanol com um esforço de inclusão social, a expansão da demanda por esse biocombustível tem atraído a cobiça do capital transnacional e dos grandes fazendeiros que buscam adquirir amplas áreas para o cultivo da cana.

A China, que tem 40% dos agricultores do mundo e dispõe somente de 9% de terras cultiváveis procura, à semelhança de fortes grupos econômicos americanos e argentinos, adquirir terras para o plantio de grão e criação de gado, sobretudo nas áreas do Maranhão, Piauí e Tocantins. No Brasil, não existe legislação específica sobre a aquisição de terras por empresas estrangeiras e o interesse do capital transnacional é atraído pelas enormes áreas cultiváveis ainda não exploradas.

Calcula-se que, dos 853 milhões de hectares da área total do país, 470 milhões são ocupados por cidades, áreas de proteção e de reservas indígenas. A agropecuária ocupa 278 milhões de hectares, sendo 199 milhões para pastagens e 79 milhões para a agricultura. Estima-se que o país tenha 104 milhões de hectares agricultáveis, principalmente nas áreas do cerrado, sem avançar sobre a floresta amazônica. Ademais, 80% das pastagens no Brasil central são terras degradadas, suscetíveis de recuperação para o plantio da cana.

O etanol brasileiro à base de cana é altamente competitivo para o americano à base de milho e o europeu, com base na beterraba. O baixo custo relativo do etanol favorece os consumidores de combustíveis que optaram por carros menos poluentes, também “flex-fuel”.

Dada a experiência secular do Brasil – quase 500 anos de cultivo da cana e sua destilação, o país dispõe de uma tecnologia de industrialização exportável, inclusive do uso do bagaço para geração de energia.

Entretanto, impõe-se ao poder público uma série de precauções e critérios para a construção de novas usinas, regulamentando o licenciamento para projetos sucroalcooleiros, com o objetivo de a)aliviar impactos ambientais; b) conservar a biodiversidade; c) proteger os recursos hídricos; d) melhorar a qualidade do ar e e) cuidar do solo, através de zoneamento agro-ecológico que limita, regula e fiscaliza, inclusive “multando” os transgressores.

A produção de etanol a partir da cana-de-açúcar implica numa série de impactos negativos cujos custos não são assumidos pelos produtores, mas sim transferidos como externalidades à população. As queimadas de cana para moagem causam uma densa fuligem que se espalha por dezenas de quilômetros, afetando seriamente a saúde da população, particularmente de crianças e idosos que sofrem de doenças respiratórias.

Outro problema decorre do uso da vinhaça, subproduto da destilação. Cada litro de etanol produz 14 litros de vinhaça que, em parte, é aproveitada para adubar os plantios. Porém, seu uso eleva o nível de substâncias tóxicas no solo e afeta a temperatura da água nos locais onde é utilizada para irrigação, diminuindo a quantidade de oxigênio, vital para a vida aquática. Finalmente, o uso da vinhaça só é rentável para áreas de plantio próximas à usina, quando levado pela gravitação. Para áreas mais distantes, o custo do transporte inviabiliza seu uso e ela acaba sendo despejada nos rios.

Para estimular os produtores, o governo se propõe a renegociar até 90% dos R$ 87 bilhões que devem ao governo, com abatimento do principal, e ampliar o prazo para o pagamento em parcelas.

Em suma, parece mais fácil resolver os problemas energéticos suprindo biocombustível para a indústria automobilística do que resolver a escassez crescente de alimentos que afeta sobretudo a população mais carente e faminta nos países pobres e em desenvolvimento. A escassez de alimentos não é problema de falta de recursos, mas de sua má alocação. Terras, máquinas, fertilizantes e sementes foram desviados, primeiro para a pecuária e produção de soja para alimentar o gado e, hoje, são destinados para a insaciável indústria automobilística, em detrimento do abastecimento das populações carentes com alimentos.

Nos países mais pobres e mesmo nos emergentes, nos quais o custo da cesta básica atinge até 60% do orçamento familiar (na Índia, e até 30% no Brasil e no México), o aumento dos produtos primários – fertilizantes, máquinas, resinas e sementes – reflete a situação precária dos consumidores de baixa renda. A soma dos aumentos chega ao fim da cadeia, elevando dramaticamente os preços dos alimentos.

Assim, questiona-se a racionalidade do próprio sistema que coloca diariamente mais de 900 carros em circulação na cidade de São Paulo que, além de poluir o ar, aumentam o congestionamento das ruas e tornam o trânsito insustentável. Confrontando essa situação com a concentração fabulosa de riquezas nas mãos de um pequeno grupo de multibilionários, questiona-se a (ir)racionalidade total do sistema que a humanidade deve enfrentar neste começo do século XXI.

* Henrique Rattner é professor da FEA-USP e consultor do Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT). Foi fundador da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Lideranças (ABDL) e diretor do programa LEAD no Brasil.


(Envolverde/Mercado Ético)

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Entrevista ao Brasil de Fato, o canadense Leo Panitch discute as possibilidades da esquerda no cenário mundial



“A tarefa dos novos movimentos é reorganizar a classe trabalhadora"

Frente à atual crise do capitalismo, o canadense Leo Panitch discute as possibilidades da esquerda no cenário mundial
Eduardo Sales de Lima
da Redação do Brasild e Fato



A esquerda poderia se utilizar da atual crise econômica para reorganizar os trabalhadores enquanto classe social, motivando-os a desenvolver consciência de classe, para, assim, construir um tipo de movimento político estrutural ligado ao Estado, à semelhança do que ocorre na Venezuela e na Bolívia. A avaliação é do cientista político canadense Leo Panitch, um dos principais estudiosos contemporâneos da teoria marxista.


Em entrevista ao Brasil de Fato, Panich afirma que, na conjuntura política atual, “a esquerda percebe que os protestos não são suficientes, que é preciso construir um tipo de movimento político estrutural ligado ao Estado, que tente entrar no Estado e transformá-lo”.


Brasil de Fato - Como a atual crise econômica, acompanhada de outras, como a alimentar e energética, pode servir como uma oportunidade para o fortalecimento da esquerda?

Leo Panicth – Entramos em uma nova conjuntura, na qual a esquerda latino-americana está, mais uma vez, liderando. No começo dos anos 2000, todos os protestos anti-globalização nos fóruns sociais mundiais, com o centro em Porto Alegre (RS), foram muito significativos. Eu acreditava que eles ajudariam a minar a ideologia do neoliberalismo, que vive em crise atualmente; sem falar na crise do preço dos alimentos, da crise energética. Mas, objetivamente, o neoliberalismo é descontínuo. O capital continua muito forte, até mesmo na crise. Mas ninguém acredita mais nessa ideologia, tão longamente admirada, da mínima intervenção do Estado, da concepção de que as relações comerciais podem auto-regular o mercado. Mas qual é a nova conjuntura da correlação de forças que foi transformada? Uma conjuntura na qual a esquerda percebe que os protestos não são suficientes, que é preciso construir um tipo de movimento político estrutural ligado ao Estado, que tente entrar no Estado e transformá-lo. Quem tem feito a diferença nesse novo caminho da esquerda da América é (Hugo) Chávez, especialmente a partir de 2002. Somado a ele, Evo Morales, que ajudou a construir um partido político a partir de um movimento social, e conseguiu se eleger. Mesmo no Paraguai é possível ver mudanças. O elevado índice de abstenção na última eleição presidencial mexicana também significou muito. O povo sente que tem que entrar no Estado. Fora da América, existem movimentos similares na Alemanha, que tem um novo partido de esquerda, formado a partir do velho partido da Alemanha oriental e que se separou dos social-democratas, o Die Linkie (Esquerda, traduzido do alemão).


A participação dos conselhos comunais na Venezuela podem servir como exemplo de participação popular no Estado?


São importantes no sentido de demonstrar o desenvolvimento de capacidades populares, construindo unidade a partir desses conselhos. Existem conselhos comunais colocando demandas para Chávez, e até mesmo apoiando o presidente. Mas não temos a informação do tipo de classe, da identidade de classe das pessoas que participam deles. Esse é um grande problema na Venezuela.


O governo Lula tem uma clara influência de segmentos da direita no país. Os movimentos sociais têm responsabilidade pelo fato de o governo não ter se aproximado da esquerda, principalmente agora, em seu segundo mandato?

Sim. Ele se tornou muito rapidamente um típico governo parlamentarista social-democrata. Uma grande tragédia. Os movimentos sociais botaram bastante confiança no Partido dos Trabalhadores (PT) e em Lula. Todo aquele encontro em Porto Alegre (RS) ocorreu com o auxílio dos movimentos sociais que protestavam contra a globalização capitalista, mas não era possível fazer isso eternamente. Eles aprenderam que até Lula já faz parte do processo de globalização.

Com a perda de credibilidade do neoliberalismo abre-se uma nova oportunidade para a esquerda mobilizar suas forças populares?

No Manifesto da Partido Comunista, Karl Marx e Friederich Engels disseram que o primeiro passo de um partido é organizar o proletário dentro de uma classe e formar uma corrente organizada, consciente, ativa, um grupo social. Não é ir para governo e nem propor políticas a ele. E isso é constantemente desconstruído na sociedade capitalista, porque as pessoas são consideradas cidadãos, consumidores. Elas o são também, mas isso quebra a unidade que eles poderiam formar como classe trabalhadora. É o que o PT fez na década de 1980, o que a CUT fez nos anos 1980, o que os movimentos camponeses fizeram. Foi conversar individualmente com cada trabalhador e determinar uma mentalidade de classe, e isso se constrói dentro um processo cultural, não é feito por meio do “politiquês”; isso é cultural.Isso é feito por meio da música, do teatro. A classe trabalhadora que o PT e CUT organizaram nos anos 1980 é desorganizada em 1990. Mesmo eles tendo conseguido voto para o Lula. Eles foram desorganizados porque as pessoas votaram individualmente no Lula. Não é uma coisa fácil, mas a tarefa dos novos movimentos políticos deve ser reorganizar a classe trabalhadora.

Em um plano utópico, como um governo realmente de esquerda agiria na administração do Estado?

O tipo de Estado inovador precisa acontecer quando um governo de esquerda estiver nele, eleito, tendo como principal trabalho usar sua legitimidade para ajudar as pessoas que não estão organizadas fora do Estado, a se organizarem e conquistarem mais força, na luta contra o capital e até mesmo nas suas lutas contra o Estado. Alguns quadros do PT têm essa concepção, mas eles não tiveram a coragem para fazer isso dentro do Estado. Se você dá condições às pessoas de protestar, mesmo que seja contra o governo, isso não se configura como clientelismo porque o Estado não está pondo dinheiro dentro do bolso privado, mas ajudando a organizar uma força social. Claro, a burguesia chamará isso de clientelismo. A segunda coisa mais importante: é impossível chamar uma sociedade de democrática se você tem somente o direito de votar nas eleições. Nós não temos o direito de decidir sobre que é investido e o que é produzido. Isto é não-democrático. E um terceiro ponto: Quando um neoliberal diz “Nós precisamos de menos Estado”, ele frequentemente é apoiado pelos pobres. Por que? É preciso que o Estado seja menos burocrático, o Estado está distante dos pobres. Se você fosse uma mãe solteira, que dependesse de um auxílio do governo, você acha que você não ficaria com medo do Estado?

O mundo está presenciando a decadência do domínio econômico dos Estados Unidos?

O capital transpassa o Estado e foge do controle do mesmo. Os Estados têm sido os reforços da globalização capitalista. Quem fez o Nafta? As corporações ou os Estados? Os Estados assinam os acordos das atas. O capital não pode fazer nada sem o Estado. Os Estados Unidos, especialmente a partir de 1945, se tornou o centro da elaboração do capitalismo global. Depois de 1945, ele construiu impérios que foram definidos após a Segunda Guerra Mundial. O domínio dos EUA sobre a reconstrução dos países foi um modo de se constituir em império. Depois daqueles sub-impérios terem se exaurido dentro de suas guerras, os Estados Unidos adquiriram uma responsabilidade como se fosse inata. “Eu serei um Estado internacional”. Os Estados Unidos têm agido como tomando a responsabilidade de banco do capitalismo mundial, por meio da Organização das Nações Unidas (ONU) e do Banco Mundial. Isso causa conflito porque é ainda também o Estado de formação social americano. Isto tudo gera uma tensão entre o que a burguesia americana quer e o que o mercado global capitalista quer. O poder dos Estados Unidos está mais penetrado nos maiores países capitalistas do que em seu próprio país. Por meio da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), por meio dos maiores investimentos estrangeiros diretos. Assim avança o capitalismo de Estado. Devemos parar de pensar que, quando falamos em imperialismo, o Japão ou a União Européia irão desafiar os Estados Unidos. Eles são parte de um complexo no qual estão comprometidos com os estadunidenses na direção do capitalismo global.

Qual a influência da China nessa conjuntura?

Apesar do seu incrível crescimento, a China ainda é um “player” muito pequeno. Seu investimento na África chega a 5% do total das inversões internacionais no continente. Em 50 anos, a China preocupará mais os Estados Unidos.Veremos. O desenvolvimento do capitalismo chinês está acontecendo de acordo com as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC), baseado da penetração do capital ocidental no país. Sem precedentes na história chinesa, testemunhamos o que tem sido a maior penetração de investimentos no país.


O que as eleições estadunidenses podem trazer em relação a uma nova atitude da esquerda mundial? A esquerda tem como se aproveitar de uma vitória do candidato democrata Barack Hussein Obama?

Primeiro de tudo, o fato de se eleger um negro nas eleições presidenciais dos Estados Unidos é simbolicamente muito importante. Também, na atual conjuntura, eleger alguém que é contra a guerra no Iraque é muito importante também. Entretanto, é importante dizer que as políticas de Obama não são diferentes na essência em relação à linha principal das dos democratas que, nos últimos anos, têm sido bastante pragmáticos, se comprometendo com todas as medidas das forças do capitalismo. Seu programa não é radical, ele não rompe com o neoliberalismo; ele certamente não romperá com as regras do império como diretor do capitalismo global. Não devemos ter ilusões em relação a ele, mas devemos lembrar que, quando John Kennedy foi eleito, em 1960, ele era muito radical e não fez muito, mas uma nova energia foi transmitida, um novo nível de expectativa foi dado aos jovens e negros dos Estados Unidos. Gerou coragem e inspiração para começar a luta por direitos dentro do país. Se eles o elegerem terão inspiração em organizar-se, e pressioná-lo. Como foi feito em vários movimentos de direitos humanos e nos movimentos de mulheres nos anos 1960. Essa é minha esperança. Mas também espero que haja o mesmo efeito ao redor mundo e que as forças progressistas sintam-se capazes de fazer mais, mesmo que Obama os desaponte, não trilhe ao lado deles. Essa é minha esperança.

Quem é - Leo Panicht é Professor de Política Econômica do Canada Research e da Universidade de York, na Inglaterra. Considerado uma das principais referências na discussão da teoria marxista. Tem 61 anos e também é editor da revista Socialist Register. A primeira vez que visitou o Brasil foi em 1982.